domingo, 2 de abril de 2017

O Santo Graal na arca perdida de Israel

Uma estudante examina vasilhas no Depósito dos Tesouros Nacionais.

O Santo Graal, o cálice do qual bebeu Jesus na última ceia, provavelmente não era de cristal nem de metal, mas sim de pedra calcária, o material purificador preferido entre os judeus da primeira metade do século I para servir suas refeições. É o que explica em tom professoral Gideon Avni, chefe da divisão arqueológica da Autoridade de Antiguidades de Israel, durante uma incomum visita da imprensa ao lugar mais sagrado de sua pesquisa, que reúne mais de um milhão de restos da antiguidade localizados dentro do país desde seu nascimento, em 1948.
Não se trata de um bunker secreto inexpugnável nem de um recinto fortificado sob a proteção do Tzahal, o poderoso Exército israelense, mas sim de um armazém na cidade de Beit Semesh, no Distrito de Jerusalém. O edifício de aparência anódina esconde um depósito misterioso, cortado por fileiras intermináveis de estantes com sarcófagos e ânforas, além de caixas de madeira das quais emergem capitéis. Uma decoração apropriada para a cena final do primeiro filme da saga cinematográfica de Indiana Jones: o misterioso depósito governamental onde fica oculta, precisamente, a Arca da Aliança.
Junto à taça das primeiras décadas da era cristã se alinham pratos e vasilhas de pedra calcária à vista das câmeras dos jornalistas. Também se vê um pequeno ossário, em que se vê inscrito o nome de Jesus. Em uma tumba judaica similar foi encontrado o calcâneo (osso do calcanhar) de um homem atravessado por um grosso prego de 15 centímetros de comprimento. "Jesus, Maria e José eram nomes hebraicos comuns naquela época", assinala Avni. "Em relação à crucificação, trata-se de um método de execução habitual sob o Império Romano", acrescenta o professor ao lado de uma réplica do tarso perfurado, "embora nestes restos o prego atravesse de forma lateral o osso, e não frontal, como na iconografia clássica".
“Pudemos reconstituir como se desenvolvia a vida cotidiana durante o primeiro terço do século I, que coincide com a vida do Jesus segundo a tradição cristã, mas não provar sua existência”, afirma o chefe do serviço de arqueologia israelense. “Havia mais de um milhão de habitantes na região, e é muito difícil identificar os restos de alguém que pode ter vivido há mais de 2.000 anos.”
No Depósito dos Tesouros Nacionais de Beit Semesh − que em um futuro próximo deverá ser transferido para as imediações do Museu de Israel, no centro de Jerusalém −, conservadores e técnicos mostram aos fotógrafos moedas do século VII e cruzes e relicários também da era bizantina. Mostram também um capitel com uma menorá (candelabro de sete braços) gravada nele com credenciais históricas judaicas.
Um sarcófago do Depósito dos Tesouros Nacionais, em Israel.
Pudemos reconstituir como se desenvolvia a vida cotidiana durante o primeiro terço do século I, que coincide com a vida do Jesus segundo a tradição cristã, mas não provar sua existência”, afirma o chefe do serviço de arqueologia israelense. “Havia mais de um milhão de habitantes na região, e é muito difícil identificar os restos de alguém que pode ter vivido há mais de 2.000 anos.”
No Depósito dos Tesouros Nacionais de Beit Semesh − que em um futuro próximo deverá ser transferido para as imediações do Museu de Israel, no centro de Jerusalém −, conservadores e técnicos mostram aos fotógrafos moedas do século VII e cruzes e relicários também da era bizantina. Mostram também um capitel com uma menorá (candelabro de sete braços) gravada nele com credenciais históricas judaicas.
A arqueóloga Annette Landes-Nagar mostra algumas moedas da época do Império Bizantino.
Este gigantesco armazém arqueológico não pode ser visitado pelo público e só abre suas portas aos pesquisadores. Como em quase todos os aspectos da vida no Oriente Médio, a geopolítica também pesa sobre os restos antigos que estão armazenados. Em suas instalações só se custodiam objetos localizados em território israelense desde sua fundação como Estado, há 69 anos, e em Jerusalém Oriental (ocupada desde 1967 e anexada em 1980).
Os achados procedentes de escavações anteriores se encontram principalmente no Museu Rockefeller, construído sob o Mandato Britânico na zona oriental da Cidade Santa, diante do antigo recinto amuralhado. A conservadora Débora Ben Ami, de origem argentina, assinala que os restos arqueológicos procedentes da Cisjordânia, sob ocupação israelense há quase meio século, são levados por enquanto para um armazém perto do assentamento de Maale Adumin, situado apenas cinco quilômetros a leste de Jerusalém.
O percurso recente de correspondentes estrangeiros em Israel pelas instalações do Depósito dos Tesouros Nacionais foi patrocinado pelo Ministério do Turismo, em uma iniciativa destinada a promover as visitas de peregrinos cristãos à Terra Santa. Um negócio que representou um quinto do total de 2,8 milhões de entradas de viajantes no país em 2015. Nas mesmas datas ocorreu também a apresentação oficial da restauração do templo do Santo Sepulcro, em Jerusalém, uma obra custeada pelas congregações religiosas do local com ajuda das autoridades jordanianas e palestinas, que atraiu a atenção da imprensa internacional.
Um terço dos 40.000 objetos arqueológicos localizados a cada ano em 300 escavações em Israel está relacionado com o cristianismo. No momento, quase todos continuam empacotados em um armazém com ares de filme de Steven Spielberg. Como o cálice de pedra calcária que pode muito bem ter estado nas mãos de Cristo. É a boa nova que pregam os arqueólogos.(El País.com)

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