quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Por que enxergamos " rostos" em objetos ou lugares

Uma parede na Toscana, Itália, que lembra um rosto sorridente
 
Você já deve ter visto imagens do tipo na internet: uma casa que lembra o rosto de Hitler; Donald Trump no ouvido de um cachorro; uma jujuba parecida com Kate Middleton.
Percepções como essas têm nome - são exemplos da pareidolia, quando identificamos padrões familiares, como um rosto, em indícios aletórios como imagens ou sons.

Por que temos a experiência da pareidolia?

Não tema: se você vive experiências de pareidolia, está tudo bem.
Como humanos, somos "programados" a reconhecer rostos.

A foto 'Surprised Ship', de Asaf Peer, aparenta um rosto surpreso; já 'Cheerful Grater', de Tony Belpaeme, mostra um 'sorriso largo'

Isso faz sentido sob uma perspectiva evolucionária, diz o psicólogo Rob Jenkins, da Universidade de York.
"Se há um rosto por perto, há uma mente por perto. Isso é algo que pode potencialmente fazer muito bem ou mal a você", diz ele.
Uma folha aparenta um rosto com a boca abertaDireito de imagem Getty Images
Image caption Ah, pareidolia, não brinque comigo...

E o reconhecimento de rostos começa cedo.
"Bebês com nove minutos de vida parecem mostrar uma preferência por padrões semelhantes a rostos", diz Jenkins.

Uma casa aparenta rosto ranzinza

Em testes, recém-nascidos passam mais tempo olhando para padrões com pontos e traços que se aproximam à imagem de dois olhos e uma boca do que para padrões sem aparência de um rosto.
Não é preciso muito estímulo visual para vermos um rosto. Algumas manchas escuras nas posições dos olhos e da boca são tudo o que precisamos.

Mas humanos são realmente tão especiais?

Uma ovelha participa de um experimento diante de rostos - incluindo uma foto do ex-presidente americano Barack Obama
 
Um estudo de 2017 mostrou que as ovelhas têm a habilidade de reconhecer rostos humanos familiares.
Pesquisadores da Universidade de Cambridge conseguiram treinar animais para identificar os atores Jake Gyllenhaal e Emma Watson, o ex-presidente americano Barack Obama e a jornalista da BBC Fiona Bruce.

Espuma da cerveja aparenta rosto assustado

E enquanto somos muito bons em reconhecer rostos familiares, somos piores do que pensamos em identificar desconhecidos: em um experimento, pesquisadores mostraram a participantes pessoas em duas fotografias diferentes. Ao perguntarem se as imagens mostravam a mesma pessoa, houve uma taxa de erro na faixa de 20%.
Com rostos que não conhecemos, diferenças sutis como a iluminação, a expressão, a maquiagem ou estilo de cabelo podem dificultar as nossas habilidades de reconhecimento.

E como é nosso desempenho em comparação com máquinas?

Um cabo HDMI que mais parece um rosto assustador
 
O correspondente de tecnologia da BBC Rory Cellan-Jones diz que softwares de reconhecimento facial existem há muito tempo, mas ainda não alcançaram as expectativas.
Quanto mais imagens os computadores recebam como demanda para processar, menos precisos eles tendem a ser.
"Há uma quantidade extraordinária de variação nas imagens para as quais os computadores são treinados", diz.
Então, quem ganharia em uma batalha de reconhecimento facial - humanos ou computadores?
"Depende da tarefa", diz Rob Jenkins. "Se é um humano que conhece o rosto que está vendo, aposte no humano com convicção. Se o rosto é desconhecido, a máquina pode ter a vantagem."
Mas, para Jenkins, diante do avanço rápido da tecnologia, não demorará muito para que sejamos totalmente superados pelas máquinas.

Um pimentão amarelo que se parece com um rosto

Poluição do ar chega aos bebês durante a gravidez, diz estudo

Feto humano
 
Pesquisadores da Universidade Queen Mary, no Reino Unido, acabam de colocar mais uma peça no quebra-cabeça dos efeitos da poluição atmosférica no corpo humano. Em um estudo inicial, eles encontraram partículas de materiais poluentes, comumente detectados em grandes cidades, nas células da placenta de cinco mulheres.
É a primeira evidência científica de que os componentes da poluição do ar atingem a placenta depois de passar pelos pulmões e cair na corrente sanguínea.
A nova pesquisa examinou as placentas de cinco mulheres não fumantes que tiveram bebês saudáveis no hospital da Universidade. Com o consentimento delas, os pesquisadores examinaram os macrófagos - células do sistema imunológico que "comem" partículas danosas ao corpo - presentes suas placentas.
Estas células estão presentes nos pulmões e também fazem parte do sistema que protege o feto no tecido da placenta.
O estudo foi apresentado neste mês de setembro no Congresso Internacional da Sociedade Respiratória Europeia (ERS, na sigla em inglês), mas ainda não foi publicado em revistas científicas.
Usando um microscópio óptico, os pesquisadores encontraram 72 partículas negras entre 3.500 células. As partículas, examinadas com instrumentos ainda mais potentes, se parecem com as partículas de sujeira encontradas nos macrófagos dos pulmões.
 
Ciclista usa máscara em Londres
 
"Ainda não sabemos se as partículas que encontramos podem passar para o feto, mas as pesquisas sugerem que isso é possível", disse à BBC News Brasil a pediatra Norrice Liu, parte da equipe de pesquisadores da Queen Mary.
"O nosso próximo passo é examinar mais mulheres, mas também queremos entender como elas vivem e qual o nível de exposição que elas têm à poluição."
O sistema respiratório funciona como uma espécie de peneira para as partículas de poluentes. As maiores costumam ser destruídas pelas células de defesa pulmonares, mas as mais finas podem cair na corrente sanguínea e chegar a outros órgãos do corpo.
Em 2016, um estudo da Universidade de Lancaster feito em 37 pessoas encontrou partículas de poluentes em suas células cerebrais.

Menos troca de nutrientes e oxigênio entre mãe e bebê

No Brasil, pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP são alguns dos principais produtores de pesquisas que tentam compreender os efeitos da poluição urbana no corpo humano.
"O que sabemos? Que existe uma associação entre poluição e baixo peso ao nascer bastante consistente, mas não se sabe exatamente o porquê. Estudando um grupo de gestantes também vimos que as mulheres mais expostas à poluição têm mais alterações no fluxo de sangue da mãe para o bebê via placenta", disse à BBC Brasil o professor Paulo Saldiva, do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Faculdade de Medicina da USP.
Em dezembro de 2017, um estudo brasileiro comprovou, em camundongos, que a exposição a poluentes atmosféricos, antes ou durante a gravidez, altera algumas características da placenta, além de causar distúrbios em um sistema hormonal que controla a troca de substâncias entre a mãe e o bebê.
Os animais foram expostos a partículas PM 2,5 - poluentes comuns no ar em centros urbanos - dentro dos limites diários permitidos pela Organização Mundial de Saúde.
Um grupo foi exposto 15 dias antes da gestação, outro grupo teve contato com a poluição por 15 dias a partir do sexto dia da gravidez. Um terceiro grupo foi exposto das duas formas e um quarto foi poupado da poluição.
"A placenta das ratas diminuiu com a exposição às partículas de poluição em todos os casos de exposição. A superfície da placenta que fica em contato com a parede do útero diminuiu", disse à BBC News Brasil o médico Joel Claudio Heimann, professor da USP e orientador do experimento, que fazia parte de uma tese de doutorado.
"Essa superfície é um indicador funcional da transferência de alimentos e oxigênio da mulher para o feto. Quanto menor é ela, menor é a transferência."
Diferentemente da nova pesquisa britânica, no entanto, os brasileiros não chegaram a examinar as células placentárias em busca das partículas de poluentes que estariam lá.
"No resultado que obtivemos, não tínhamos outro fator de interferência que não a poluição. Então, as alterações que encontramos eram, sim, referentes à poluição", afirma a pesquisadora Sônia de Fátima Soto, a autora do estudo.
"Estamos indo para um caminho interessante de provar que a poluição, mesmo dentro desse limite que a OMS diz ser seguro, causa problemas à nossa saúde e à nossa prole. Mas é preciso solidificar mais esses estudos para poder, por exemplo, questionar os limites da OMS."
 

'Catástrofe de saúde pública'

Nos últimos anos, cientistas vêm demonstrando que a exposição a poluentes durante a gravidez aumenta o risco de um parto prematuro e de que o bebê tenha um peso menor ao nascer.
Um estudo britânico que analisou 500 mil nascimentos e foi publicado em dezembro confirmou a conexão, e os pesquisadores afirmaram que o caso é uma "catástrofe da saúde pública mundial".
Em trabalhos anteriores, pesquisadores brasileiros e estrangeiros estabeleceram ligações entre a poluição e uma maior probabilidade de que o feto exposto desenvolva hipertensão e outras doenças.
"Já temos evidências suficientes de que as nanopartículas de poluição chegam a todos os órgãos. Mas qual vai ser a resposta do feto depende da genética do bebê, de características familiares e epigenéticas, ou seja, do que acontece durante gravidez", explica Saldiva.
Uma revisão de estudos coordenada pelo pesquisador e publicada em 2016 afirma que "a exposição pré-gestacional, gestacional e no início da vida aos poluentes do ar está associada com o comprometimento da função pulmonar e outras condições respiratórias negativas na infância e esses efeitos podem durar até a vida adulta".
Os mecanismos pelos quais isso acontece, segundo o artigo, ainda não são completamente conhecidos, mas podem incluir alterações no DNA do feto e alterações no corpo da mãe, como stress e inflamação das células e hipoxia - baixa concentração de oxigênio nos tecidos.
"A verdade é que a mãe não pode fazer nada do ponto de vista individual para se proteger dessa chegada de partículas tóxicas ao bebê", alerta Saldiva.
"Só podemos tentar diminuir a exposição à poluição."
BBC
 

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Kiribati: O primeiro país que o mar vai engolir com a mudança climática

Cerca de 100.000 pessoas vivem em Kiribati, um arquipélago no Pacífico que está em alerta desde 1989 por causa do nível do oceano. Um documentário conta a emigração de seus habitantes e a luta de seu ex-presidente.
 
 
Já se disse que Kiribati, um Estado composto por 33 ilhas no meio do Pacífico, algum dia vai virar uma Atlântida, e que seus habitantes ficarão irremediavelmente submersos pelas águas do oceano. Um relatório da ONU alertava, já em 1989, que esse seria o primeiro país a ser dizimado pela mudança climática no século XXI, devido à elevação do nível dos mares. O Governo desenhou nos últimos anos um plano de transferência populacional para as quase vizinhas ilhas Fiji, caso a inundação se confirme, e seu ex-presidente Anote Tong percorreu o mundo na última década levando o nome de seu país por todos os fóruns possíveis: a sede da ONU, as cúpulas climáticas, programas de televisão, visita oficiais a outros Estados, o Vaticano...
 
O ex-presidente Anote Tong, protagonista do documentário.
 
O fotojornalista canadense Matthieu Rytz aterrissou nesse país para uma reportagem há quatro anos e disse a si mesmo: “Esta é minha história”. Sem nenhuma experiência prévia no audiovisual, investiu todas as suas economias para acompanhar Tong em suas viagens e gravar o documentário Anote’s Ark (“a arca de Anote”), que estreou no festival de Sundance e será exibido no madrilenho Another Day Film Festival, que acontece de 4 a 7 de outubro. A programação do evento reúne cerca de 20 documentários sobre ativismo, desenvolvimento sustentável, consumo responsável e saúde global. A história de Anote fecha o ciclo.
“Estamos tão isolados que sempre achamos que as atribulações do mundo nada tinham a ver conosco, mas aqui estamos, submetidos ao fenômeno global da mudança climática”, diz o ex-presidente no filme. Em 2016, ele perdeu as eleições para Taneti Mamau, um mandatário que promoveu uma guinada na política externa de Tong e se centrou em potencializar o turismo e a pesca num plano para os próximos 20 anos. Depois de quatro anos indo e vindo das ilhas, Rytz já não é bem recebido em Kiribati. “No Natal passado fui para lá projetar o documentário. Para mim era importante que, depois de ter convivido com eles, vissem o resultado. Estava na casa de alguns amigos com minha mulher, e três policiais ficaram com meu computador e me disseram que eu precisava pegar o próximo voo”, relata por telefone.
Os habitantes de Kiribati são gente da água. Brincam nela, dela obtêm seu alimento diário, são açoitados por violentas tempestades, suas casas são construídas com o pé na areia. “Para eles o mar tem um sentido quase espiritual, sentem um grande respeito pelo oceano porque, quando você está lá, literalmente só vê mar”, conta o cineasta. Além de ser devorados completamente pelo Pacífico, seus habitantes já enfrentam a falta de água potável, e alguns povoados costeiros precisaram se deslocar alguns metros para o interior do território. O documentário de Rytz contém lindas imagens em que a água, que lhes dá vida e pode acabar matando seu país, é a protagonista. Grandes planos gravados com um drone mostram o imenso azul que rodeia Kiribati e onde seus cidadãos submergem a cada dia.
O documentário também acompanha Tiemeri, mãe de seis filhos que decide abandonar a ilha em busca de um futuro para sua família na Nova Zelândia. Kiribati ocupa 139º. lugar entre 184 países que compõe o ranking do IDH (índice de desenvolvimento humano). A população do país oceânico não para de crescer, e a natalidade supera os três filhos por mulher. Organizações como o Banco Mundial elaboraram relatórios para propor a acolhida obrigatória dos      por parte da Austrália e Nova Zelândia. Os kiwis oferecem anualmente 75 postos de trabalho para os quiribatianos, graças a um acordo bilateral.
Mais de metade da população de Kiribati é católica, mas o fotojornalista relata que nos últimos anos a igreja mórmon de Utah (EUA) andou investindo dinheiro nesse Estado insular e ganhando adeptos para sua fé. “A maioria da comunidade nestas ilhas se organiza em torno da igreja, é um lugar de encontro para eles. Por isso quando o presidente foi ver o Papa estava convencido de que seria algo relevante”, resume Rytz. No filme, é possível ver igrejas abarrotadas, com paroquianos que brigam por espaço para beijar as imagens religiosas antes das danças tradicionais polinésias.
Enquanto limpa um peixe, Tong resume assim a realidade em que vive há mais de uma década: “Quem foi embora perdeu a conexão espiritual com Kiribati, porque já não se considera nativo. Não podemos resistir, estas ilhas vão desaparecer. Se formos embora, preservar nossa cultura e tradições não será nada fácil”.

Imagem do documentário sobre Kiribati.

BBC Brasil

O navio Português que naufragou há 400 anos e foi encontrado só agora

Uma embarcação naufragada há 400 anos encontrada na costa de Portugal vem sendo considerada a "descoberta da década" para a arqueologia subaquática do país.
 
Imagem mostra embarcação encontrada no fundo do mar em Cascais, Portugal
Especiarias como pimenta, cerâmicas e canhões com o brasão de armas português gravado foram localizados perto dos destroços, nas proximidades de Cascais, cidade a 31 km da capital, Lisboa.
A equipe de arqueólogos acredita que o navio estava voltando da Índia quando afundou, entre 1575 e 1625.
Essa época foi o auge do comércio de especiarias de Portugal com a Ásia.

'Valor patrimonial'

A descoberta foi feita como parte de um projeto arqueológico de 10 anos apoiado pela cidade de Cascais, pelo governo e pela marinha portuguesa, bem como pela Universidade Nova em Lisboa.
Em entrevista ao jornal britânico The Guardian, à CNN e à agência de notícias Reuters, o diretor do projeto, Jorge Freire, observou que ela é importante porque "diz muito", por exemplo, "sobre a história e identidade marítima de Cascais".
O especialista afirmou que o naufrágio - achado 12 metros abaixo da superfície - estava muito bem preservado e que os objetos encontrados e o próprio navio são de grande valor patrimonial.
"Do ponto de vista do patrimônio histórico, é a descoberta da década", disse Freire, para quem o achado "é o mais importante de todos os tempos" para Portugal.
"O reconhecimento da comunidade científica de que é a descoberta da década, do século, em termos de arqueologia marinha, é para nós uma grande satisfação", reforçou o prefeito de Cascais, Carlos Carreiras, em entrevista à CNN.

Embarcação encontrada no fundo do mar em Cascais, Portugal, segundo especialistas, podem ajudar a contar história da cidade

Embarcação encontrada no fundo do mar em Portugal estaria voltando da Índia quando naufragou carregada de mercadorias

Embarcação encontrada no fundo do mar em Cascais, Portugal, estava carregada com mercadorias como porcelanas

Ao jornal britânico The Guardian, ele descreveu a descoberta como um dos achados arqueológicos mais significativos da última década e analisou que, embora o cargueiro ainda não tenha sido identificado, pode ser significativo para a cidade.
"É uma descoberta extraordinária, que nos permite conhecer mais sobre nossa história, reforçando nossa identidade coletiva e valores compartilhados", declarou Carreiras. "Isso, por sua vez, certamente nos tornará mais atraentes e competitivos".
Fragmentos de porcelana chinesa do final do século 16 e início do século 17 também estavam entre os destroços, assim como pedaços de artilharia de bronze e conchas usadas como moeda no tráfico de escravos.
O ministro da Cultura, Luis Mendes, disse que a foz do Tejo era considerada um ponto crítico para as embarcações que se aproximavam da costa portuguesa.
E que "esta descoberta veio para provar isso".
A Câmara Municipal de Cascais disse que o navio foi encontrado no início de setembro, durante um serviço de dragagem na região da foz do rio Tejo, que desemboca em Lisboa. Os vestígios estão dispersos em uma área estimada em 100 metros de comprimento por 50 metros de largura.

Imagem mostra mergulhador registrando imagens de objetos encontrados nas proximidades de embarcação que naufragou há 400 anos em Portugal

Imagem mostra mergulhador registrando imagens de objetos encontrados nas proximidades de embarcação que naufragou há 400 anos em Portugal

Fragmentos de porcelana chinesa do final do século 16 e início do século 17, especiarias, pedaços de artilharia de bronze e conchas usadas como moeda no tráfico de escravos estavam entre os destroços encontrados em embarcação que naufragou 400 anos atrás em Portugal

BBC

Como nasceu o primeiro sistema de transporte coletivo do mundo

Considerado um dos grandes pensadores da humanidade, o francês Blaise Pascal (1623-1662) estava longe de atuar apenas no campo das ideias.
 
Modelos da carruagem de Pascal
Conhecido por seus teoremas matemáticos e tratados filosóficos estudados até hoje, poucas pessoas sabem que, no século 17, o matemático, que inventou a primeira máquina de calcular da história, criou algo que também mudaria para sempre a vida das pessoas nas grandes cidades: o transporte coletivo.
Graças ao espírito inquieto de Pascal, o transporte urbano mundial tem até data de nascimento: 1662.
Naquela época, Paris já era uma grande cidade com cerca de meio milhão de habitantes, mas as pessoas que não tinham meios próprios se deslocavam de um lugar para outro, na maior parte das vezes, a pé.
Para facilitar a vida dos cidadãos, Pascal desenvolveu um sistema de transporte urbano de carruagens com itinerários fixos, tarifa e horários regulares. O filósofo sugeriu ao duque de Roaunez pedir permissão ao rei Luis 14 para explorar o serviço, no que foi atendido.
A passagem do sistema pioneiro custava cinco "sols", oriunda de "sou", moeda que circulava na França na época de Luis 14. Eram três linhas iniciais. A primeira servia entre a porte Saint-Antoine e o Luxembourg e começou a operar em 18 de março de 1662.
Em 11 de abril foi inaugurada a segunda linha, que ia da Rue de Saint-Antoine até a Rue Saint Honoré. A terceira e última rota foi aberta em maio daquele ano e ligava o bairro de Montmartre ao Luxembourg.
 
Decreto Luis XIV autorizando transporte coletivo em Paris
 
A novidade foi um sucesso entre a população parisiense, conforme depoimento da própria irmã de Pascal, Gilberte Pérrier, presente ao evento de inauguração:
"O 'estabelecimento' iniciou sábado às sete horas da manhã, mas com um brilho e pompa maravilhosos. Distribuíram-se as sete carruagens que ocuparam esta primeira rota", registrou Gilberte.
Mas na viagem inaugural já começaram os conhecidos problemas de mobilidade urbana e transporte enfrentados pela população até hoje.
"A coisa obteve tanto sucesso que, desde a primeira manhã, havia uma quantidade de carruagens cheias; mas, depois do almoço, havia uma multidão tão grande que não se podia se aproximar delas, e os outros dias foram iguais. De modo que o maior inconveniente delas é aquele temido: a multidão nas ruas esperando uma carruagem, mas quando ela chega está cheia."
"Havia alguns (passageiros) que diziam que ele foi perfeitamente bem inventado, mas que era uma grande falha só ter sete carruagens na rota, e que elas não davam nem para a metade das pessoas que dela necessitavam", completou a irmã de Pascal - ele, por causa da saúde precária, morreu no mesmo ano em que o seu invento foi para as ruas.
O sistema funcionou por mais alguns anos, mas devido a problemas como a administração, foi encerrado e só surgiria novamente na Europa muito tempo depois.
A invenção de Pascal surpreende de forma positiva até os estudiosos em Ciências Humanas.
"Imaginamos que os grandes filósofos estão sempre no mundo das ideias e longe do cotidiano das pessoas, o que não é verdade", explica o filósofo Luis César Oliva, professor do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP).
 
Eurico Galhardi, pesquisador em história do transporte público
 
"Quando estudamos a vida deles a fundo, descobrimos o quanto eles eram humanos e tinham um cotidiano como nós, o que é incrível", completa Oliva, que fez o seu mestrado e doutorado sobre a obra de Blaise Pascal.
"O ensino formal geralmente fica muito em cima das grandes obras filosóficas e esquece que os pensadores também inventaram coisas muito bacanas e essenciais para o nosso dia a dia", completa o professor da USP, lembrando que Pascal também inventou uma máquina aritmética de cálculo mecânico, considerada a avó das calculadoras modernas.
"Pascal era um grande pensador. Ele conseguiu enxergar, já naquela época, que para uma cidade progredir é necessário resolver o problema de mobilidade urbana", diz o pesquisador em história do transporte público Eurico Galhardi, autor do livro Conduzindo o Progresso - A História do Transporte.

Beija-mão

Segundo Galhardi, após o encerramento do projeto de Pascal, o transporte público sobre rodas renasceria muito longe da França, mais precisamente no Brasil. "Criamos o segundo projeto de transporte coletivo no mundo", diz Galhardi, que é presidente do conselho diretor da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU).
A chegada Família Real ao Brasil, em 1808, instituiu a cerimônia do "beija-mão", em que os súditos iam até a Corte para agradar o rei chegado de Portugal. O problema era a distância a ser percorrida pelo povo para chegar à cerimônia no palácio e tentar alguns favores, perdões ou mesmo benefícios reais.
Para resolver isso, em 18 de agosto de 1817 o rei D. João 6º assinou um decreto que autorizava um dos empregados da Corte, Sebastião Surigué, a explorar um serviço de carruagens entre o Paço Imperial, no centro do Rio de Janeiro, e a Fazenda Santa Cruz, a cerca de 50 quilômetros e uma das residências oficiais da Família Real.
"Esse decreto é uma verdadeira certidão de nascimento do transporte coletivo no Brasil", diz Galhardi. Os veículos eram puxados por quatro animais, os lugares eram numerados e as passagens custavam oito réis.
Uma segunda linha de carruagens para facilitar o "beija-mão" ligava o Paço Imperial à Quinta da Boa Vista, outra residência oficial da Família Real e que abrigava até recentemente o Museu Nacional, destruído por um incêndio em setembro deste ano.
"Há muito tempo sabemos a necessidade de criar formas de deslocamento coletivos para as pessoas se movimentarem", diz o presidente executivo da NTU, Otávio Cunha. A entidade desenvolve diversos estudos e projetos de mobilidade urbana no país.
Cunha lembra que o Brasil é pioneiro também em outra modalidade de transporte que posteriormente se espalhou pelo mundo: o Bus Rapid Transport (BRT), criado em Curitiba (PR) na década de 70 pelo então prefeito Jaimer Lerner. Na época, a ideia era desenvolver um sistema de transporte sobre rodas rápido e eficiente como o metrô, mas a custos menores do que o transporte subterrâneo.
"Apesar do nosso pioneirismo em criar sistemas, pagamos um alto preço por não ter políticas públicas eficientes de transporte coletivo para facilitar a mobilidade urbana em nossas cidades. Com isso, deixamos de fazer o que o resto do mundo fez nesse sentido, como ocorreu na Europa", diz Cunha.
BBC
 

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Onde ficam os mapas mais desejados pelos caçadores de tesouros

maria antonia colomar
 
É uma peça única, o primeiro mapa realizado com técnicas chinesas que chegou à Espanha (e talvez à Europa) vindo do Extremo Oriente. Veio atravessando os mares, em algum momento entre 1574 e 1575, sob o reinado de Felipe II, quando a monarquia espanhola vivia sua época de esplendor, quando se falava de um império em que o sol nunca se punha, aquilo sim era vocação global. Traçou a rota que à época percorriam as mercadorias que vinham do Oriente Distante: da China às Filipinas, das Filipinas ao México e do México à Espanha.
“Iremos ver a maravilha das maravilhas”, diz María Antonia Colomar instantes antes de retirar o véu, o papel barreira, que é antiácido e protege uma joia do século XVI como essa. A veterana historiadora acaba de colocar luvas azuis finas para poder manipular o documento. É fundamental não tocá-lo com os dedos, os mapas absorvem a umidade das mãos que os toca.
Uma enorme mesa branca recebe o minucioso e valioso mapa em que o curso do rio Amarelo é laranja. Essa é a insólita nota de cor em um mapa, em seu restante, preto e branco. Provavelmente viajou acompanhado de livros, obras de arte e cerâmicas que naquela época chegavam de Manila, a grande ponte entre Oriente e Ocidente. Colomar, que dedicou 46 anos de sua vida ao Arquivo das Índias, o considera um dos tesouros que passaram por suas mãos.
Ao lado de Carmen Molina, que trabalha no laboratório de restauração, explica que a joia foi extraída nessa mesma manhã de um porta mapas especial, de alumínio anodizado, que permite excelente conservação. Datado de 1555, é um mapa histórico da China que narra a história de suas cidades. Sucintos textos explicativos acompanham os desenhos que ilustram a orografia do terreno. O Ku-Chin hsing-shêng Chih T’U [Mapa topográfico moderno e antigo (da China)] evidencia até que ponto era avançada a cartografia dos chineses nessa época.
A silhueta da muralha da China cruza de leste a oeste a parte superior do mapa. Provavelmente, diz Colomar, foi enviado por um dos governadores de Manila, em resposta aos pedidos de informação da Coroa sobre as colônias. Com ele se pretendia realçar a grandeza do país. “Naqueles anos houve até um governador das Filipinas, Francisco de Sande, que pensou em invadir a China”, diz a historiadora. “Fez a proposta, mas o dissuadiram”.
Colomar revela a história que esse mapa esconde com uma mistura de entusiasmo e precaução. Entusiasmo pelos anos passados entre mapas, papéis e cartas que habitam os régios muros do Arquivo das Índias, aprendendo a interpretá-los, a amá-los. Precaução extrema, que algumas vezes faz com que interrompa uma frase e comece por novas rotas narrativas quando em sua cabeça surge a suspeita de que possa estar proporcionando algum dado incorreto, ou não suficientemente comprovado. Rigor acima de tudo.
O Ku-Chin hsing-shêng Chih T’U é uma das peças das quais ela jamais se esquecerá. Nascida em Mallorca há 73 anos, radicada em Sevilha desde 1969, Colomar recebeu em março o Prêmio Nacional 2017 da Sociedade Geográfica Espanhola. Um reconhecimento ao trabalho paciente e silencioso dos arquivistas, pessoas que trabalham nas sombras. Classificando, estudando e expondo valiosos documentos que depois servem para que os pesquisadores, romancistas, descobridores e exploradores recebam as medalhas. Colomar, na realidade, se aposentou há três anos. O dia 7 de junho de 2015 foi quando deu por concluída sua etapa como funcionária do Arquivo das Índias.

Mitos nos Andes. Esse mapa documenta uma região localizada nas margens do rio Marañón, no Peru. Os indígenas aparecem vestidos nas regiões conquistadas e nus nas que ainda estão livres. O explorador Salgado de Araujo o usou para convencer a Coroa que deveria retornar à região: lá, descrevia, era possível encontrar “esmeraldas aos montes”.

“Todo o arquivo é um tesouro”, diz falando das joias que passaram por suas mãos na instituição sevilhana que é, de fato, um local de atração aos caçadores de tesouros do mundo. O Arquivo das Índias, declarado patrimônio mundial pela Unesco em 1987, é a memória viva dos territórios ultramarinos da Espanha imperial. Contém 40.000 documentos, robustos pacotes de documentação antiga com aroma a pergaminho que armazenam mais de 80 milhões de páginas e por volta de 8.500 mapas, planos, desenhos e imagens (área da qual ela foi responsável). Aqui, em um antigo consulado de comércio de solenes escadarias de mármore e estantes de mogno de Cuba, Carlos III decidiu em 1785 que deveria ser centralizada toda a documentação oficial relativa às Américas e às Filipinas.
Entre as paredes desse edifício abobadado onde Murillo teve, na parte alta, seu ateliê se entesouram cartas e expedientes enviados pelos vice-reis, documentos remetidos pelos bispos, inventários do que transportavam os navios que iam e voltavam das Índias. E aqui é o local em que algumas pessoas vieram em 2007 à procura de informação sobre o naufrágio do Mercedes, barco carregado com remessas de ouro e prata do Peru que foi bombardeado pelos ingleses no golfo de Cádiz em 5 de outubro de 1804. A peripécia dessa embarcação teve, dois séculos mais tarde, grande eco midiático ao se transformar em objeto de disputa entre o Estado espanhol e a empresa caçadora de tesouros norte-americana Odyssey. María Antonia Colomar assistiu na primeira fila todo o processo e proporcionou (ao lado de suas colegas de arquivo) alguns dos pontos que fizeram a balança pender a favor da Espanha em seu litígio no Tribunal Federal de Tampa, Flórida.
Os caçadores de tesouro da Odyssey chegaram a Sevilha em 2007 com a intenção de extrair toda a informação que o Arquivo das Índias pudesse ter sobre o barco naufragado 190 quilômetros a oeste do estreito de Gibraltar. Colomar estava encarregada dos papéis da Audiência de Lima, dentre os quais se encontrava o registro da fragata, um documento fundamental: dá informação sobre as mercadorias que estavam nos barcos. Na Espanha do XIX servia para controlar as importações e arrecadar impostos, essenciais para alimentar a máquina de guerra.
O trabalho de pesquisa realizado com suas colegas Isabel Ceballos e Pilar Lázaro de la Escosura, e da qual participaram outras instituições como o Museu Naval e o Arquivo Histórico Nacional, serviu para esclarecer o que aconteceu com esse lendário barco cujo nome ficou indefectivelmente associado ao chamado caso Odyssey.
A fragata atravessava o golfo de Cádiz, capitaneada pelo comandante José Manuel de Goicoa y Labart, quando foi atacada de surpresa pela Marinha britânica. Uma bomba acertou em cheio o paiol do Mercedes. O capitão de navio Diego de Alvear, que antes da saída de Montevidéu havia trocado, com seu filho Carlos, de barco - do Mercedes ao Medea pela doença de seu capitão, Tomás de Ugarte y Liaño -, observou de longe como o navio em que viajavam sua mulher e oito filhos explodia. 51 pessoas sobrevieram ao naufrágio em que morreram 249 marinheiros; um ataque que foi o prelúdio da batalha de Trafalgar.
A documentação do Arquivo deu à Odyssey parte das ferramentas para identificar o barco e poder exigir a propriedade das aproximadamente 590.000 moedas de ouro e prata extraídas dos restos do Mercedes no golfo de Cádiz. O Governo da Espanha iniciou um litígio para pedir os direitos da descoberta. E foi a documentação da Secretaria da Fazenda do Arquivo das Índias que em parte permitiu desmontar os argumentos dos caçadores norte-americanos. O registro do navio e a documentação procedente do Museu Naval confirmaram que o Mercedes estava a serviço do Estado, de modo que não era legítimo que uma empresa estrangeira retirasse qualquer coisa do naufrágio: aquilo pertencia à Administração espanhola. Além disso, a identificação no Arquivo, através do registro, de peças singulares, como colheres gravadas de propriedade de José Manuel de Goicoa, uma caixinha de rapé e um pequeno almofariz encontrados nos destroços, serviu para comprovar que se tratava, efetivamente, do Mercedes.
Colomar foi a responsável por realizar essa busca, solicitada por Madri.

Ritos de Nayarit. Essa imagem mostra a influência da evangelização. Os conquistadores entraram nas montanhas em Nayarit (México) com a intenção de doutrinar seus habitantes. Após certo tempo, se retiraram. E quando voltaram ao lugar, anos depois, viram que os indígenas recuperaram seus ritos e cerimônias, mas misturando-as com as herdadas dos conquistadores. Um frei reflete o fenômeno na imagem.

A historiadora conta que antes existiam mais caçadores de tesouro do que hoje. Os tempos de pessoas como Robert Marx, um homem com centenas de naufrágios descobertos, passaram. A relação entre esses caçadores e os arquivistas, no fundo, nunca foi fácil. Os primeiros procuram coisas que os segundos, às vezes, conhecem. E o Arquivo deve estar aberto a quem quiser pesquisar. Outra coisa é que os profissionais não fica
O Arquivo também é polo de atração aos escritores de romances históricos. Por aqui passou a autora Matilde Asensi. E Marie-Ève Sténuit, narradora francesa que escreveu La veuve du gouverneur (A viúva do governador) inspirando-se na história de Isabel Barreto, uma mulher que precisou tomar a liderança de uma expedição assolada por todos os tipos de males (motins, malária, falecimento de seu marido, o capitão Álvaro de Mendaña, descobridor das ilhas Salomão). Também vinha aqui com frequência o explorador Miguel de la Quadra-Salcedo para preparar suas expedições da Rota Quetzal.
Colomar lembra todas essas histórias em seu antigo escritório enquanto do lado de fora chega o ruído de fundo de manifestantes que percorrem a avenida da Constituição de Sevilha. Mesmo tendo se aposentado há três anos, continua vindo aqui quase todas as manhãs. Ajuda a organizar exposições, recebe visitas. Divide um escritório de teto alto e estantes coroadas por papéis de sua antiga colega Isabel Ceballos, arquivista de 63 anos. “María Antonia se diferencia por sua constância”, diz Ceballos, “porque é capaz de dedicar a seu trabalho todo o tempo do mundo”.
No outro edifício que faz parte do Arquivo, o da Cilla, conectado ao principal, o da Lonja, por um túnel perimetral que passar por baixo da rua Santo Tomás e pelo qual viaja diariamente a documentação, está o que foi o escritório de Colomar até sua aposentadoria. Foi subdiretora entre 1978 e 1983, e entre 2000 e 2015. Sua amiga e sucessora, Pilar Lázaro de la Escosura, com quem trabalhou durante 38 anos, afirma que ambas são muito “germânicas”, mas que Colomar é, talvez, “mais meticulosa”. E conclui: “É a que mais conhece sobre o Arquivo”.

O primeiro mapa que chegou à Espanha (e talvez à Europa) vindo da China. Datado de 1555, narra através de pequenos textos a história das cidades do país. A silhueta da muralha da China atravessa de leste a oeste a parte superior do plano. O rio Amarelo aparece em laranja. Sobre essas linhas, funcionários do laboratório de restauração retiram os papéis que protegem o valioso mapa.

Juan Maluquer, um professor que teve no curso de História, foi quem a inoculou a paixão pela pesquisa arqueológica, que ela reconduziu aos documentos de arquivo.
María Antonia Colomar nasceu em Mallorca em uma família humilde. Fez seus estudos com a bolsa March, que só conseguia quem possuía excelentes notas. Foi para Barcelona estudar História e lá deu seus primeiros passos profissionais, trabalhando no Arquivo da Coroa de Aragão, em pleno bairro Gótico. Após passar (com outra bolsa) pelo Arquivo do Vaticano, foi aprovada no concurso que lhe permitiu optar pelo Arquivo das Índias. Chegou à cidade andaluza em 1969.
Desde 1995 mora em Gines, uma cidade de 13.000 habitantes próxima a Sevilha em que chegou seguindo os passos de sua grande amiga Magdalena Pons, Maina, a menina com quem dividia o sanduíche na escola, em Mallorca. “Ela estudava muito; sempre gostou do trabalho bem feito, custe o que custar”, lembra Maina na casa de sua amiga, sentada no sofá da sala. Nessa casa limpa e organizada reinam os seis gatos que fazem companhia a Colomar, alimentados com mamadeira.

Mapa que mostra uma vista geral do território que circunda o povoado de Chimalhuacán-Atoyac, “a cinco léguas” da Cidade do México. Foi elaborado em cumprimento da Real Cédula dada pelo rei Felipe II em 25 de maio de 1577, para que mostrasse o que os conquistadores encontravam nas Índias.

Maina descreve sua amiga como a pessoa mais generosa que conheceu em sua vida e acrescenta que “gosta muito dela, mesmo ela às vezes sendo um pouco senhorita Rottenmeier (em referência à personagem do romance Heidi, da escritora suíça Johanna Spyri)”. María Antonia, por sua vez, assume que é uma mulher quadrada, teimosa, “aragonesa”. Sua mãe era de Huesca.
De todos os documentos que passaram por suas mãos, há um que lhe fascina: o mapa dos mitos, como ela o chama. Mostra uma área dos Andes, às margens do rio Marañón, no Peru. Cheio de desenhos, onde os indígenas aparecem vestidos nas regiões conquistadas e nus nas ainda livres, foi encomendado, entre outros, por dois conquistadores, Andrés Salgado de Araujo e Pedro de Bohórquez, para justificar uma segunda expedição a essas terras por explorar.
Para convencer a Coroa da necessidade de retornar ao Peru (Birú, para os indígenas), Salgado de Araujo utilizou o mito do El Dorado. Em uma documentação anexa ao mapa, começa por alinhar os interesses da Coroa e coloca argumentos religiosos para o retorno: nas 16 províncias que aparecem no mapa, diz, existem “14 milhões de almas” (um exagero, diz Colomar) a serem evangelizadas. A partir daí aumenta o quanto pode o catálogo de potenciais riquezas. Fala de regiões tão abundantes em ouro que os indígenas o usam para “utensílios domésticos” (vasilhas, tigelas...; a louça, digamos); menciona o Cerro de Ialpay, que é como os indígenas chamam o El Dorado; diz que na província de Aute as esmeraldas se encontram “aos montes”; que no Paititi, as pérolas, do tamanho de nozes, são pescadas nos rios... O mapa é fiel reflexo do delírio da febre do ouro que se espalhava entre os conquistadores.
Os documentos mostram como os conquistadores usavam o mito do El Dorado para convencer a Coroa da necessidade de financiar novas expedições

“Com essas províncias”, escreve Salgado de Araujo, “se limita o rio das amazonas”, essas mulheres que viviam sozinhas, que não queriam homens e que, uma vez por ano, iam às aldeias para reprodução. Os mitos da literatura clássica, os dos livros de cavalaria, se enredavam nos relatos dos conquistadores. Como o das virgens do Sul, sacerdotisas que realizavam rituais em templos cobertos de prata e ouro. “Os conquistadores colocavam esses mitos sobre regiões da geografia da América”, diz Colomar. “Esse mapa mostra essa geografia mística. Os mitos e a evangelização foram motores da Conquista”.
As licenças para regressar às Américas são uma mina de histórias. No Arquivo das Índias está a que foi pedida pela famosa Monja Alférez.
As andanças de dona Catalina de Erauso começam quando foge de um convento quando tinha 15 anos e, disfarçada de homem, atravessa toda a Espanha até chegar a Sanlúcar de Barrameda. Lá embarca, como grumete, em direção às Américas. Após servir como soldado em diversas campanhas e provar seus dotes para a esgrima, obtém o grau de alferes na guerra do Chile sob um de seus pseudônimos masculinos: Alonso Díaz Ramírez de Guzmán. As crônicas contam que sua verdadeira identidade só foi descoberta quando esteve à beira da morte.
No Arquivo está a resposta do Conselho das Índias à sua solicitação de permissão para voltar ao Peru e recolher os frutos do que foi conquistado. Em 1626, pede para retornar e receber, como prêmio por seus “serviços nas guerras do Chile e Peru”, um salário de 70 pesos mensais vitalícios. A documentação do Arquivo das Índias também mostra que o rei Felipe IV a eximiu dos trâmites necessários para retornar; mas exigindo que o fizesse “em trajes de mulher”. “Foi uma pessoa excepcional”, diz Colomar.
O Arquivo das Índias abre as portas a um universo recheado de relatos e lendas. Essas foram algumas das que balizam a carreira de María Antonia Colomar. O prêmio da Sociedade Geográfica Espanhola, que aceitou com grande humildade, dizendo que muitas outras pessoas o mereciam tanto quanto ela, deu o toque final em uma vida entre papéis, mapas e planos carregados de mistérios. Colomar agora espera sua nomeação como arquivista emérita, uma decisão que depende do Ministério da Cultura. Ela o solicitou após deixar seu cargo, em 2015. Bom, deixar é uma maneira de dizer.
passaram por suas mãos, há um que lhe fascina: o mapa dos mitos, como ela o chama. Mostra uma área dos Andes, às margens do rio Marañón, no Peru. Cheio de desenhos, onde os indígenas aparecem vestidos nas regiões conquistadas e nus nas ainda livres, foi encomendado, entre outros, por dois conquistadores, Andrés Salgado de Araujo e Pedro de Bohórquez, para justificar uma segunda expedição a essas terras por explorar.
Para convencer a Coroa da necessidade de retornar ao Peru (Birú, para os indígenas), Salgado de Araujo utilizou o mito do El Dorado. Em uma documentação anexa ao mapa, começa por alinhar os interesses da Coroa e coloca argumentos religiosos para o retorno: nas 16 províncias que aparecem no mapa, diz, existem “14 milhões de almas” (um exagero, diz Colomar) a serem evangelizadas. A partir daí aumenta o quanto pode o catálogo de potenciais riquezas. Fala de regiões tão abundantes em ouro que os indígenas o usam para “utensílios domésticos” (vasilhas, tigelas...; a louça, digamos); menciona o Cerro de Ialpay, que é como os indígenas chamam o El Dorado; diz que na província de Aute as esmeraldas se encontram “aos montes”; que no Paititi, as pérolas, do tamanho de nozes, são pescadas nos rios... O mapa é fiel reflexo do delírio da febre do ouro que se espalhava entre os conquistadores.
“Com essas províncias”, escreve Salgado de Araujo, “se limita o rio das amazonas”, essas mulheres que viviam sozinhas, que não queriam homens e que, uma vez por ano, iam às aldeias para reprodução. Os mitos da literatura clássica, os dos livros de cavalaria, se enredavam nos relatos dos conquistadores. Como o das virgens do Sul, sacerdotisas que realizavam rituais em templos cobertos de prata e ouro. “Os conquistadores colocavam esses mitos sobre regiões da geografia da América”, diz Colomar. “Esse mapa mostra essa geografia mística. Os mitos e a evangelização foram motores da Conquista”.
As licenças para regressar às Américas são uma mina de histórias. No Arquivo das Índias está a que foi pedida pela famosa Monja Alférez.
As andanças de dona Catalina de Erauso começam quando foge de um convento quando tinha 15 anos e, disfarçada de homem, atravessa toda a Espanha até chegar a Sanlúcar de Barrameda. Lá embarca, como grumete, em direção às Américas. Após servir como soldado em diversas campanhas e provar seus dotes para a esgrima, obtém o grau de alferes na guerra do Chile sob um de seus pseudônimos masculinos: Alonso Díaz Ramírez de Guzmán. As crônicas contam que sua verdadeira identidade só foi descoberta quando esteve à beira da morte.
No Arquivo está a resposta do Conselho das Índias à sua solicitação de permissão para voltar ao Peru e recolher os frutos do que foi conquistado. Em 1626, pede para retornar e receber, como prêmio por seus “serviços nas guerras do Chile e Peru”, um salário de 70 pesos mensais vitalícios. A documentação do Arquivo das Índias também mostra que o rei Felipe IV a eximiu dos trâmites necessários para retornar; mas exigindo que o fizesse “em trajes de mulher”. “Foi uma pessoa excepcional”, diz Colomar.
O Arquivo das Índias abre as portas a um universo recheado de relatos e lendas. Essas foram algumas das que balizam a carreira de María Antonia Colomar. O prêmio da Sociedade Geográfica Espanhola, que aceitou com grande humildade, dizendo que muitas outras pessoas o mereciam tanto quanto ela, deu o toque final em uma vida entre papéis, mapas e planos carregados de mistérios. Colomar agora espera sua nomeação como arquivista emérita, uma decisão que depende do Ministério da Cultura. Ela o solicitou após deixar seu cargo, em 2015. Bom, deixar é uma maneira de dizer.

Na página anterior, o primeiro mapa que chegou à Espanha (e talvez à Europa) vindo da China. Datado de 1555, narra através de pequenos textos a história das cidades do país. A silhueta da muralha da China atravessa de leste a oeste a parte superior do plano. O rio Amarelo aparece em laranja. Sobre essas linhas, funcionários do laboratório de restauração retiram os papéis que protegem o valioso mapa.

Na página anterior, o primeiro mapa que chegou à Espanha (e talvez à Europa) vindo da China. Datado de 1555, narra através de pequenos textos a história das cidades do país. A silhueta da muralha da China atravessa de leste a oeste a parte superior do plano. O rio Amarelo aparece em laranja. Sobre essas linhas, funcionários do laboratório de restauração retiram os papéis que protegem o valioso mapa.!!!
El País.com


O meteorito que vale R$ 3 milhões está perdido nos escombros do Museu Nacional

Meteorito Angra dos Reis
 
Na manhã da segunda-feira, dia 3, quando as chamas que destruíram o Museu Nacional e boa parte do seu acervo diminuíram, uma imagem correu o mundo. Da entrada principal do palácio histórico, em meio à fumaça, era visível a silhueta do Bendegó, o maior e mais famoso meteorito brasileiro, composto de mais de 5.000 quilos de ferro e níquel.
Enquanto a cena inflava ainda mais a reputação do meteorito, uma outra rocha espacial muito mais discreta e menos popular, porém mais valiosa, segue desaparecida sob os escombros do museu. E deixa pesquisadores de todo o mundo em estado de apreensão.
O Angra dos Reis tem uma massa 76 mil vezes menor que a do Bendegó, meros 70 gramas. Com seus pouco mais de 4 cm de largura e valor estimado em torno de 3 milhões de reais, é a rocha mais valiosa da coleção de mais de 400 meteoritos do Museu Nacional.
"Ele deve ter se queimado, danificado um pouco, mas resistiu, não tenho dúvida", afirma a astrônoma Maria Elizabeth Zucolotto, curadora do acervo de meteoritos do Museu Nacional. Ela lembra que a rocha sobreviveu a temperaturas ainda mais elevadas quando atravessou a atmosfera terrestre. Pela sua relevância, o Angra dos Reis era mantido escondido na sala da astrônoma e não era exposto ao público.
Desde o incêndio, Zucolotto está impedida de entrar no prédio, ora pelos Bombeiros, ora pela Polícia Federal ou, mais recentemente, pela prefeitura da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ela quer entrar antes que comecem os trabalhos de reparos e sustentação das estruturas. "Existe o risco de roubarem? Existe. Sei que na sala não dá para entrar, pois o andar de cima veio abaixo. Mas quando entrarem para escorar as paredes? Alguém pode resolver levar uma lembrancinha. Ou mesmo descartar achando que é pedaço do edifício", desespera-se.

O Angra dos Reis leva esse nome pois foi avistado e recuperado na cidade do litoral fluminense em 1869. Quem o vê, não imagina estar diante de um mineral especial. A rocha é disforme, com a superfície irregular e porosa.
O bólido foi o primeiro de uma classe de viajantes espaciais até hoje muito rara. Por mais de um século, foi o único exemplar de que se tinha ciência. Até que, no fim da década de 1990, outras rochas passaram a ser descobertas ou reclassificadas como angritos, nomenclatura dada em referência ao Angra dos Reis. Segundo a The Meteoritical Society, existem apenas 28 conhecidos no mundo.
 

Bendegó

Os angritos são compostos por minerais forjados apenas nas temperaturas altíssimas do núcleo de planetas. São as rochas magmáticas mais antigas que conhecemos, formadas quando o sistema solar ainda era uma nuvem de gás e poeira.
Estima-se que o meteorito do Museu Nacional tenha 4,56 bilhões de anos. Para geólogos e astrônomos, a pequena rocha é um livro cheio de pistas sobre a origem do Sol e dos planetas.
Recentemente, o Angra foi analisado por Huapei Wang, do MIT, nos EUA, para investigar o comportamento do campo magnético que existia no disco de gás e poeira do sistema solar. Medindo minúsculos campos magnéticos preservados em angritos, é possível calcular o comportamento dessa nuvem primordial. O estudo foi publicado na revista Science, no início de 2017.
"O Angra tem algumas características que o tornam especial, um exemplar único", comenta Elizabeth. "Ele tem uma composição rara, quase que inteiramente de um mineral incomum, a fassaita. Foi também o único angrito avistado, ou seja, cuja queda foi testemunhada. Os outros foram achados."

Incêndio no Museu Nacional

A queda

Sua saga na Terra começa no final de janeiro de 1869. Foi avistado pelo médico Joaquim Carlos Travassos, que passava num bote em frente à Praia Grande, em Angra.
O objeto envolto em fumaça caiu no mar diante da Igreja do Bonfim. Travassos mandou que os escravos que o acompanhavam mergulhassem. Dois pedaços foram resgatados. Um deles, com meio quilo, foi confiado ao Juiz de Direito de Angra dos Reis e, mais tarde, doado ao Museu Nacional.
Em mais de um século de pesquisas, esse fragmento foi dividido em pequenas porções. A maior é a que está enterrada nos escombros do museu. Outras frações se perderam nos experimentos, mas ainda são conhecidas frações muito menores do Angra, com no máximo 2,5 gramas, espalhadas em coleções e de posse de pesquisadores.
Pelos relatos existentes, Travassos presenteou o sogro com o segundo fragmento resgatado do mar, que teria cerca de 1 kg. Desde então, o rastro dessa rocha se perdeu. Os pesquisadores suspeitam, em razão das características dos encaixes das pedras originais, que haja uma terceira, possivelmente ainda submersa no mar de Angra.
Os pesquisadores acreditam que o meteorito que caiu do céu deveria ter 1,5 kg. Nos últimos anos, algumas expedições de astrônomos e geólogos tentaram, sem sucesso, localizá-la e conscientizar os moradores da existência do pequeno tesouro.
Agora, todos os pedaços significativos do Angra dos Reis estão desaparecidos.

Meteorito Bendegó

Zucolotto, a guardiã do meteorito no Museu Nacional, já seguiu diversas pistas do segundo fragmento. A sua última aposta é a Igreja Católica. "Em 1888, coincidentemente o mesmo ano em que a rocha teria sido doada ao Museu Nacional, deram de presente ao papa Leão 13 um meteorito chamado Angra dos Reis."
Segundo ela, há realmente uma rocha com esse nome em um museu na residência de veraneio do papa, em Castel Gandolfo, perto de Roma. Mas o Vaticano pode ter sido enganado. O bólido que está lá não é o Angra dos Reis. Nem angrito é, mas sim um meteorito metálico de 13 kg. Não é tão relevante, mas é mais vistoso que o Angra.
"Na hora de presentear o papa, alguém pode ter falado 'vamos dar esse outro que é mais bonito'. E o Angra teria ficado aqui no Brasil, no clero", especula Elizabeth. "Mas pode ter ido mesmo ao Vaticano e lá trocado, pois antes de ir para o acervo do museu, passou por outros locais." A astrônoma não tem recursos para seguir a investigação, mas essa não é sua maior preocupação no momento.

O roubo

Não é a primeira vez que a curadora do Setor de Meteorítica do Museu Nacional sente o frio na barriga pela ausência do Angra dos Reis. Em 1997, dois mercadores de meteoritos americanos quase furtaram a rocha violeta.
Edward Farrell e Frederick Marselli foram ao museu interessados em comprar ou trocar rochas, algo comum no meio - parte da coleção do Museu Nacional foi formada na base da troca. Foram recebidos por outro professor, que não conhecia bem o acervo. Elizabeth, que dominava a coleção, não estava. Os dois manipularam diversos meteoritos, mas foram embora sem fazer negócio.
Dois dias depois voltaram, ainda fingindo interesse. Mas dessa vez Elizabeth foi encontrá-los. A astrônoma ainda deu carona aos farsantes para o aeroporto do Galeão. Desconfiada com o silêncio dos americanos, assim que os deixou ela voltou ao museu.
Farrell e Marselli haviam trocado o Angra dos Reis e mais dois meteoritos por outras rochas sem valor. Ela correu para o aeroporto e, com ajuda da Polícia Federal, recuperou as pedras.
"Não seria difícil vender o Angra por uma grande soma. Naquela época ele devia valer muito mais, pois era único. Só dois anos depois, dois meteoritos achados 20 anos antes na Antártida foram reclassificados como angritos", conta Elizabeth.

Angra dos Reis

O cofre

Vinte e um anos depois, diariamente a guardiã do Angra dos Reis sai angustiada de casa rumo à Quinta da Boa Vista na esperança de poder entrar no palácio em ruínas. Também responde a e-mails de pesquisadores de todo o mundo que chegam com a mesma pergunta: "Já achou o Angra?"
No domingo do incêndio, por pouco não conseguiu resgatá-lo. As chamas demoraram a chegar na parte de trás do prédio. Mas os bombeiros não a deixavam entrar. "Quando o bombeiro liberou o acesso, era tarde, já estava pegando fogo no andar de cima", relembra. "Mas fiquei com medo, pensei na minha vida e desisti. Cinco minutos depois, desabou tudo." Ela conseguiu resgatar 30 dos 33 bólidos que estavam em exposição.
Até pouco tempo atrás, Elizabeth era a única que sabia onde o Angra dos Reis está escondido, numa caixa que não chega a ser um cofre. "Eu sei onde ele está, sei a posição do armário, mas não tem como tirar os escombros que caíram em cima."
Desesperada, certo dia passou mal na frente do museu. Temeu um ataque cardíaco. Não era, mas decidiu confidenciar a outras pessoas a localização do seu tesouro. Agora, eles e os escombros do palácio são os guardiões do único grande pedaço conhecido do Angra dos Reis.
BBC News

Telescópio da Nasa descobre dois novos planetas

Reprodução/Reuters
 
A missão de dois anos e US$ 337 milhões do Tess almeja ampliar o catálogo dos chamados exoplanetas, mundos que circulam estrelas distantes
Um telescópio orbital desenvolvido para detectar mundos fora do sistema solar descobriu dois planetas distantes nesta semana, cinco meses após o lançamento do Cabo Canaveral, no Estado norte-americano da Flórida, disseram ontem (20) autoridades.
O Satélite de Pesquisa de Exoplanetas em Trânsito da Nasa, mais conhecido como Tess, fez uma descoberta precoce de “super-Terras” e “Terras quentes” em sistemas solares a não menos de 49 anos-luz de distância, a primeira descoberta do satélite desde o lançamento em abril.
A missão de dois anos e US$ 337 milhões do Tess almeja ampliar o catálogo dos chamados exoplanetas, mundos que circulam estrelas distantes, conhecidos pelos astrônomos.
Embora os dois planetas sejam quentes demais para comportar vida, a vice-diretora de ciência do Tess, Sara Seager, acredita em muitas outras descobertas deste tipo. “Teremos que esperar para ver o que mais ele descobre”, disse ela à Reuters. “Sabemos que há planetas lá fora, enchendo o céu noturno, só esperando para serem encontrados.”
O Tess foi concebido para capitalizar o trabalho de seu antecessor, o telescópio espacial Kepler, que descobriu a maior parte dos cerca de 3.700 exoplanetas documentados durante os últimos 20 anos e que está ficando sem combustível.
A Agência Aeroespacial dos Estados Unidos (Nasa) espera localizar milhares de mundos até agora desconhecidos, talvez centenas deles do tamanho da Terra ou “super-Terras” – não maiores do que duas vezes o tamanho de nosso planeta.
Acredita-se que nestes é mais provável encontrar superfícies rochosas ou oceanos, e por isso eles são considerados os melhores candidatos para a evolução da vida. Cientistas disseram crer que futuramente o Tess ajudará a catalogar ao menos outros 100 exoplanetas rochosos para estudos posteriores do que se tornou um dos campos de exploração mais novos da astronomia.
Na quarta-feira (19) pesquisadores do MIT anunciaram a descoberta do Pi Mensae c, uma “super-Terra” a 60 anos-luz de distância orbitando seu sol a cada 6,3 dias. A descoberta do LHS 3844 b, uma “Terra quente” situada a 49 anos-luz de distância que orbita seu sol a cada 11 horas, foi anunciada ontem (20).
Os dois planetas novos, que ainda precisam ser analisados por outros pesquisadores, oferecem uma chance para estudos posteriores, disseram autoridades.

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Como exploração sem limites de areia põe em risco grãos que "transformou a civilização"

Os visitantes do Burj Khalifa, em Dubai, atualmente o prédio mais alto do mundo, com 828 metros de altura, geralmente são apresentados a uma série de estatísticas sobre sua construção.
 
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Uma delas é que o arranha-céu consumiu 330 mil metros cúbicos de concreto, mistura que é feita principalmente de areia. Estar cercado por um deserto deve ter sido uma bênção para o ponto turístico mais famoso dos Emirados Árabes Unidos, certo?
Errado.
De acordo com o Observatório da Complexidade Econômica, um banco de dados de comércio internacional compilado pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), os Emirados Árabes Unidos são importadores líquidos da substância granular. Sim, um país no deserto que precisa importar areia.
Isso ocorre porque o material tão abundante nos Emirados Árabes Unidos não é o tipo mais apropriado para ser usado na construção civil. A areia utilizada no Burj Khalifa foi importada da Austrália.
O tipo de grão encontrado nos desertos não tem a composição certa para se misturar com água e cimento e se tornar concreto - uma fórmula na qual areia e cascalho são os componentes mais abundantes.
Pode parecer estranho, dadas as vastas extensões de deserto do mundo, mas alguns especialistas têm alertado para uma possível crise no abastecimento global de areia.

Uso x taxa de renovação

A areia é uma matéria-prima usada para fazer mais do que concreto. É a partir do aquecimento de seus grãos que também é produzido o vidro, por exemplo. As estações de tratamento de água, por sua vez, ainda a usam como filtro.
"Areias de vários tipos são ingredientes essenciais na fabricação de detergentes, cosméticos, pasta de dente, painéis solares e chips de silício. Nossa civilização é construída literalmente na areia", diz o jornalista Vince Beiser, autor de um livro lançado recentemente sobre o tema, O Mundo em um Grão: A História da Areia e Como ela Transformou a Civilização.
Beiser tem feito reportagens sobre areia há anos e sua produção inclui artigos sobre o mercado negro do produto.
De acordo com sua pesquisa, há países como o Marrocos, onde a areia extraída ilegalmente representa uma parte substancial de seu consumo.
"Em um número chocante de países, pessoas estão sendo presas, torturadas e assassinadas por causa da areia. Ainda assim, a quantidade de areia sendo extraída em todo o mundo está aumentando - a custos terríveis para as pessoas e para o planeta".
O consumo é impulsionado pela crescente urbanização - de acordo com as Nações Unidas, a porcentagem da população global que vive em áreas urbanas aumentará de 54% para 66% até 2050. Desde 1950, a população urbana global aumentou de 746 milhões para 3,9 bilhões.
Há temores de que a demanda pelos grãos proverbiais tenha atingido um ponto insustentável.
Em um relatório contundente divulgado em 2014, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) estimou que o consumo global de areia e cascalho estava "conservadoramente em mais de 40 bilhões de toneladas por ano" e alertou para questões de sustentabilidade.
"Areia e cascalho representam o maior volume de matéria-prima usada na terra depois da água. Seu uso excede em muito as taxas de renovação natural", disse o relatório.
"Essa grande quantidade de material não pode ser extraída e usada sem um impacto significativo na biodiversidade, na turbidez da água (uma das medidasde qualidade) e nos níveis. Há também consequências socioeconômicas, culturais e até políticas".
A Índia, por exemplo, tem visto a proliferação de gangues dedicadas a montar operações ilegais de mineração e silenciar dissidentes com violência.
As autoridades indianas enfrentam acusações de fechar os olhos para a exploração de trabalhadores dedicados à extração de areia.

Negócios bilionários

As atividades ilegais são estimuladas por um simples fato: a areia é um bom negócio.
O mercado global de areia vale US$ 70 bilhões (cerca de R$ 290 bilhões), segundo especialistas em comércio da ONU. Seu preço médio no mercado internacional cresceu quase seis vezes nos últimos 25 anos.
"A ideia de areia espalhada por praias ou intermináveis ​​desertos dificulta pensar na escassez, sem falar nos efeitos ambientais e humanos de sua extração. Especialmente quando os custos de extração são baixos e o acesso é quase ilimitado", explica Aurora Torres, ecologista do Centro Alemão de Pesquisa Integrativa sobre Biodiversidade.
Grandes consumidores como Cingapura e China não conseguem o suficiente de seus mercados domésticos.
Cingapura é o maior importador do mundo, graças a um programa de quatro décadas de expansão territorial no qual a ilha recuperou terras do mar - uma área total de 130 quilômetros quadrados.
O projeto continuou, apesar da decisão de vários países vizinhos de suspender as exportações de areia para a ilha, por razões que variavam de preocupações ambientais a considerações políticas sobre rotas marítimas e fronteiras territoriais.
A China usou mais concreto (e mais areia) durante seu boom de construção entre 2011 e 2013 do que todo o consumo dos Estados Unidos durante o século 20, de acordo com dados da International Cement Review e do US Geological Survey.
No entanto, a segunda maior economia do mundo usa areia para algo além do que erguer espigões ou abrir novas rodovias.
O país recuperou terras do Mar do Sul da China, mais especificamente nas Ilhas Spratly, um arquipélago cuja soberania é reivindicada por vários países, mas que foi gradualmente tomada elos chineses.
 
"Isso significa que os países podem literalmente mudar suas fronteiras. A China construiu a maior frota de dragagem do mundo e, desta forma, pode transportar mais areia do fundo do oceano para construir mais terras artificiais do que qualquer outra nação na Terra", acrescenta Beiser.
Mas a extração de areia pode ter um efeito dramático. Autoridades na Indonésia relataram o desaparecimento de ilhas inteiras por causa da mineração intensiva de areia, que levou à erosão.
A mineração excessiva também torna as áreas costeiras e fluviais mais propensas a inundações - algo preocupante quando consideramos que o nível do mar está subindo.
Em um artigo publicado no ano passado na revista Science, Aurora Torres e colegas também relataram que há evidências de que a mineração de areia no Sri Lanka exacerbou o terrível impacto do tsunami que atingiu o país 2004 e matou mais de 30 mil pessoas.

Como insetos estão espalhando a contaminação por microplásticos

Uma pesquisa da Universidade de Reading, no Reino Unido, revelou que os microplásticos - partículas com menos de 5 milímetros - podem ser carregados das águas poluídas dos rios e lagos por mosquitos, afetando novos ecossistemas e ameaçando aves e outros animais que se alimentam de insetos.
 
Os cientistas observaram a evolução de larvas de mosquito que ingeriram microplástico e perceberam que os resíduos permanecem no corpo até a idade adulta. Ao voar, o inseto transfere o microplástico para diferentes ambientes e pode acabar contaminando outros animais.
"Os mosquitos adultos representam uma via de contaminação potencial a outros ecossistemas", concluíram os pesquisadores Amanda Callaghan, Rana Al-Jaibachi e Ross N. Cuthbert.
Os resultados da observação foram publicados na revista científica Biology Letters. Outras pesquisas haviam demonstrado a transferência de microplástico entre animais terrestres e aquáticos - como baleias, peixes e tartarugas que ingerem resíduos jogados ao mar.
Mas, segundo os cientistas, essa é a primeira pesquisa que comprova a transferência de microplástico da água para o ar, por meio de um inseto que divide os estágios de vida entre habitat aquático e terrestre.
"Esse estudo demonstra a existência de um novo caminho de transferência do microplástico da água para o ar e o solo. Os mosquitos são vetores desses resíduos e isso afeta a cadeia alimentar", disse à BBC News Brasil a pesquisadora Rana Al-Jaibachi, uma das autoras da pesquisa.
O estudo também indica que outros insetos voadores, além dos mosquitos, são capazes de ingerir e espalhar microplástico de rios e mares para terra e ar.
 
 
 
"A pesquisa aponta que qualquer organismo que passa parte da vida na água pode transferir poluição por plástico para o ar e contaminar outros organismos com os quais interajam", disse Al-Jaibachi.
"Esses insetos incluem libélulas e mosquitos. E a maioria deles integra a cadeia alimentar de animais terrestres vertebrados."
Entre os bichos que comem insetos estão pássaros, morcegos e aranhas. "Esse estudo é um alerta sério sobre a ameaça a organismos que vivem em diferentes ecossistemas", afirma a pesquisadora.

Riscos de contaminação com microplásticos

Os cientistas destacam que é preciso mais estudos para identificar a exata extensão das consequências da ingestão de microplástico por animais e seres humanos, mas sabe-se que algumas dessas partículas podem ser tóxicas.
"Os microplásticos podem ter sido contaminados por outros produtos químicos ou substâncias tóxicas, o que pode prejudicar a saúde dos seres humanos direta ou indiretamente", afirmou Al-Jaibachi à BBC News Brasil.
Outros estudos apontam para o risco de que a ingestão de microplástico reduza a absorção de nutrientes e cause danos ao sistema digestivo, especialmente em espécies animais de menor porte.
E já há evidências de que os seres humanos ingerem microplásticos ao comer animais, frutos do mar e até ao beber água.

Microplástico até na água mineral

Um teste feito com 250 garrafas de água de 11 marcas líderes do mercado, incluindo a brasileira Minalba, revelou que há micropartículas de plástico em 93% delas.
A pesquisa, realizada pela Universidade Estadual de Nova York e liderada pela Orb Media, organização jornalística sem fins lucrativos, examinou garrafas compradas em nove países diferentes, de cinco continentes, e descobriu uma média de dez partículas de plástico por litro.
As empresas avaliadas afirmam que seus produtos atendem aos mais altos padrões de segurança e de qualidade. E dizem que falta regulamentação sobre microplásticos e que não há métodos padronizados para testes.
Por isso, a Organização Mundial da Saúde anunciou, em março, que fará uma pesquisa para identificar os efeitos de médio e longo prazo do microplástico na saúde. Ainda não há prazo para a divulgação dos resultados.
Enquanto isso, os pesquisadores da Universidade de Reading pretendem ampliar os estudos sobre o efeito direto, nos seres humanos, da ingestão de microplástico por mosquitos.
"O impacto nos humanos precisa de mais investigação. Mas sabemos que os humanos têm mais contato com mosquitos do que com outros insetos, especialmente com àquelas espécies que podem viver em ambientes domésticos", disse Rana Al-Jaibachi.
BBC News

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Whatsapp deve ganhar modo escuro em breve


 
Entre os recursos que estão cogitados para aparecer em futuras atualizações do WhatsApp, há a possibilidade de o mensageiro ganhar um modo escuro. A especulação surgiu de uma fonte anônima, que falou ao WABetaInfo.
De acordo com o site, foram encontradas diversas referências código-fonte das versões de teste do WhatsApp, algumas delas mencionando o "dark mode (modo escuro)", capaz de deixar toda a interface do aplicativo com tons mais escuros para visualização mais confortável em ambientes com pouca iluminação.
 
WhatsApp
"Fico feliz em dar as boas notícias com exclusividade: o WhatsApp está finalmente desenvolvendo o Dark Mode! É um sonho. Existem muitas referências secretas importantes em atualizações recentes!", comentou o WABetaInfo.

Apesar do anúncio, ainda não foi detalhado como o modo escuro alterará a interface do WhatsApp, tampouco divulgada capturas de tela mostrando o novo visual do app.
Em contrapartida, um detalhe interessante foi comentado: o modo escuro poderia culminar em um consumo menor de bateria em aparelhos com tela OLED, uma vez que a tecnologia de display é capaz de controlar individualmente os LEDs, desligando todos aqueles que não estão em uso. Por isso, a funcionalidade poderia ser uma boa pedida, mas somente se o "dark mode" realmente exibir uma interface preta em vez dos costumeiros tons de cinza.
Caso o rumor seja confirmado, o WhatsApp se juntará aos aplicativos do Twitter, o Pocket, o Discord e o Reddit, que já oferecem a opção de alterar para o modo escuro tanto no Android quanto no iOS.
Outro possível recurso que pode estar à caminho do aplicativo de mensagens, ainda segundo o que foi dito recentemente pelo WABetaInfo, é a funcionalidade de "deslizar para responder", que deve substituir o atual método de responder a mensagens específicas a partir do comando de manter o dedo pressionado por alguns segundos.