sexta-feira, 8 de julho de 2016

Cientistas revelam uma nova chave do envelhecimento

 
Há pessoas que aparentam 50 anos, mas têm 65. Outras comem de tudo e nunca engordam. Há quem viva 100 anos bebendo e fumando, e outros que envelhecem em poucos anos, sem que ninguém, nem sequer os melhores cientistas do mundo, saibam explicar exatamente por quê. Agora, um estudo com ratos revela um processo biológico pouco conhecido que pode influir num envelhecimento saudável: a interação entre os dois genomas.
A maior parte da informação genética que herdamos de nossos pais está no genoma nuclear, o extenso livro de instruções para a vida que contém 24.000 genes e três bilhões de letras. O novo estudo, dirigido por cientistas espanhóis, centra-se em outro genoma muito menor, o das mitocôndrias. Em cada célula do corpo pode haver centenas, inclusive milhares destes orgânulos encarregados de gerar energia. Cada um inclui um genoma de 16.000 letras e 37 genes, sempre herdados da mãe. Já se suspeitava que tivessem um papel no envelhecimento, ainda que poucas pesquisas tivessem tentado mostrar exatamente qual seria.
“Passamos nove anos acompanhando 20 gerações de ratos”, diz ao EL PAÍS José Antonio Enríquez, nesta quinta-feira na Nature. O trabalho contou com a colaboração das universidades de Saragoça e Santiago de Compostela, além do Conselho de Pesquisas Médicas do Reino Unido.Todos os ratos tinham um genoma nuclear idêntico, para que os cientistas pudessem testar os efeitos de genomas mitocondriais diferentes. Os resultados mostram que basta uma mudança relativamente pequena no genoma mitocondrial para provocar mudanças notáveis no ritmo de envelhecimento e nas doenças correlatas. O estudo mostra que um dos dois genomas mitocondriais analisados prolonga a vida dos roedores em 16% e os torna menos propensos à obesidade, ao diabetes e inclusive a alguns tumores.
Enríquez afirma que a chave desse envelhecimento saudável está na interação entre ambos os genomas. Um dos dois genomas mitocondriais analisados gera mais oxidantes (ROS), um grupo de moléculas que inclui os radicais livres e que tradicionalmente foram apontadas como culpadas por acelerar o envelhecimento. “Se os níveis desses compostos disparam é péssimo, porque eles danificam as membranas celulares, mas se os níveis não subirem tanto o que acontece é que a célula ativa um mecanismo de autorreparação que gera membranas novas e elimina as velhas”, explica Enríquez. “Este processo de estresse controlado em longo prazo renova a célula, pois a faz queimar mais gorduras e preservar açúcares, o que pode explicar por que os ratos são menos obesos e não sofrem desequilíbrios de açúcar que poderiam desencadear o diabetes”, detalha. Segundo Enríquez, o estilo de vida e a interação entre os dois genomas são cruciais para o envelhecimento saudável observado nos animais.
Este mecanismo se ativa desde que o indivíduo nasce e tem repercussões ao longo de toda a sua vida. O genoma mitocondrial do envelhecimento acelerado pode ser mais vantajoso na vida selvagem, porque permite ao animal gerar mais mitocôndrias e, portanto, mais energia em um ambiente de competição com outros machos, onde é comum morrer jovem nas mãos de outros machos ou de predadores. Entretanto, no pacífico ambiente de um laboratório, o genoma mitocondrial jovem contribui em longo prazo para uma vantagem, raciocina Enríquez. Seus resultados agora abrem caminho para explorar os efeitos de outros perfis genéticos mitocondriais. Nos humanos, existem dezenas destas linhagens em cada continente.
Enríquez opina que, no futuro, seria possível aplicar esses conhecimentos à medicina. Saber como interagem o genoma mitocondrial e o nuclear nos permitirá “saber como se é e o que é preciso fazer para ficar o mais saudável possível, incluindo a forma como você vai reagir ao exercício, à dieta e aos medicamentos”, assinala.
O estudo também tem importantes implicações para os futuros “bebês com três pais”, crianças que nasceriam sem a doença genética mitocondrial que herdariam das suas mães, graças a uma técnica de modificação de embriões que já foi aprovada no Reino Unido. Os autores do estudo observam que substituir as mitocôndrias pode alterar o metabolismo do receptor do transplante de mitocôndrias. “Como técnica não é perfeita e não elimina em 100% as mitocôndrias defeituosas”, alerta Enríquez. Sua equipe agora está investigando os efeitos metabólicos de compartilhar dois genomas mitocondriais. Até que eles sejam conhecidos, acrescenta, “é importante que os transplante de mitocôndrias sejam feitos com doadores compatíveis, com um perfil o mais parecido possível do receptor”.
EL País.com

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