quinta-feira, 31 de julho de 2014

Falta financiamento para finalizar a vacina contra vírus Ebola


29 de julho de 2014 | Por Annie Sneed

O mais recente surto do vírus Ebola na África Ocidental é o pior de todos. Até dia 28 de julho 2014 ele havia infectado mais de 1.200 pessoas e fez pelo menos 672 vítimas fatais desde o início da primavera. Guiné, Libéria e Serra Leoa têm casos confirmados. Um funcionário da organização não governamental Médicos Sem Fronteiras qualificou o surto como "totalmente fora de controle", segundo a NBC News.
Infelizmente, os médicos não têm vacinas ou terapias eficazes. Os profissionais de saúde só podem tentar fortalecer o sistema imune dos pacientes (controlando fluidos, níveis de oxigênio, pressão arterial e tratando outras infecções) para ajudar os pacientes a resistir ao vírus.
Uma vacina para ajudar a combater futuros surtos de Ebola pode estar disponível em breve. Durante a última década os pesquisadores fizeram progressos significativos, e as vacinas têm funcionado em primatas não humanos. Mas tem sido difícil obter financiamento para testes de segurança em humanos.
Para saber mais sobre os avanços recentes e os obstáculos, Scientific American falou com Thomas Geisbert, virologista no Departamento de Microbiologia e Imunologia da Universidade do Texas Medical Branch em Galveston. Ele estuda o vírus Ebola desde 1988 e atualmente está envolvido em pesquisa e desenvolvimento de vacinas.
Existem vacinas promissoras em desenvolvimento para o vírus Ebola? Existem algumas vacinas preventivas em desenvolvimento e ficou demonstrado que três a cinco delas protegem primatas não-humanos contra Ebola. Algumas dessas vacinas requerem três ou mais injecções e outras precisam de uma única aplicação. A maioria delas está sendo financiada pelo governo dos EUA. Estão em vários estágios de desenvolvimento, mas nenhuma delas está pronta para ser licenciada.
O ponto crítico destas vacinas é o teste em humanos. É aí que cientistas se frustram porque sabemos que estas vacinas protegem os animais e não entendemos muito bem o processo de regulamentação, o por que as coisas não podem ser mais rápidas. Eu não sei dizer porque está demorando tanto.

 Por que o sistema imune humano não combate o vírus?

O vírus Ebola é geralmente transmitido por contato próximo e as primeiras células que afeta são importantes para a resposta imune imediata do organismo - os monócitos, macrófagos e células dendríticas. Essas células são importantes porque eles são as primeiras a reconhecer que algo estranho entrou no corpo e a acionar o sistema imune inato para combater a infecção. A infecção prejudica a mobilização do sistema imune de modo eficaz e o corpo tem dificuldade para combater o vírus, que se multiplica a ponto de afetar os principais órgãos.

 Uma vacina é capaz de neutralizar esses efeitos?

Vou dar um exemplo de como uma vacina pode funcionar. A vacina VSV é provavelmente uma das mais promissoras, e é baseada em um vetor viral semelhante ao vírus da raiva, uma partícula viral em forma de cartucho. Em sua superfície há uma proteína estrutural do tipo glicoproteína que permite a um vírus reconhecer, se ligar depois assumir o controle da célula hospedeira. Na vacina, removemos o gene que codifica a glicoproteína do vírus VSV e substituímos pelo gene que codifica a glicoproteína do vírus Ebola. O resultado é uma vacina que tem uma glicoproteína Ebola na superfície.
O vírus vacinal não se comporta como Ebola porque o resto do seu genoma não é Ebola mas, ao carregar a glicoproteína do Ebola, gera resposta imune. Mais tarde, os anticorpos gerados pela vacinação permitem que o corpo reconheça a glicoproteína do Ebola verdadeiro como um corpo estranho e crie uma resposta imune contra o vírus.
De quanto tempo em desenvolvimento é a vacina VSV? Estamos agora tentando obter os fundos para fazer os estudos com humanos.

 Quais são os desafios biológicos do desenvolvimento de uma vacina para o Ebola?

Existem algumas vacinas com vírus inativo, o que significa que não se replicam, e  tendem a ser mais segura. Há outras vacinas que são mais eficazes, mas eles são aptos a se replicar replicação [vírus atenuados] ." Um exemplo deste último tipo seria a vacina contra o sarampo ou a vacina contra a febre amarela. Elas são geralmente de vírus atenuados, não tão perigosos como um vírus de tipo selvagem, mas algumas pessoas podem ter um efeito adverso quando recebem uma vacina com vírus atenuados (replication competente).
Vacinas de vírus atenuados podem exigir uma única injeção, enquanto que as vacinas de vírus inativados podem permitir surtos periódicos porque não são tão eficientes. Então vamos fazer para uma vacina que proteja os humanos em uma única injeção? Na África essa é praticamente uma imposição porque é uma área em que você tem sorte se encontrar alguém em uma clínica para ser vacinado uma vez. É uma espécie de compensação da eficácia em relação a segurança. Esse é um dos maiores desafios.

Você pode dar uma estimativa de tempo para se ter uma vacina eficaz contra o vírus Ebola?

Meu palpite é de dois a seis anos. Infelizmente, realmente depende de apoio financeiro para as pequenas empresas que desenvolvem estas vacinas. Estudos em humanos são caros e requerem uma grande quantidade de dólares do governo. Ebola representa um pequeno mercado global - sem grande apelo para uma grande empresa farmacêutica produzir uma vacina, por isso vai exigir financiamento de governo.
Gostaria que as tentativas de avançar rapidamente no desenvolvimento de nossas vacinas levassem imediatamente a estudos  de fase I. Acho que devemos começar com a vacinação dos profissionais de saúde em áreas de alto risco. Este surto é singular pois está ocorrendo em uma área onde a doença não havia sido registrada antes e também porque aparentemente há uma maior percentagem de pessoal médico infectado agora.
Todas estas vacinas funcionam em inúmeros animais, não observei qualquer efeito adverso provocado por elas. Respeito as preocupações com segurança, mas seria ótimo se houvesse alguma forma de apressar isso. As pessoas estão sendo expostas a Ebola com 60% a 90% de chance de morrer. Temos que avaliar a necessidade de vacina nesse contexto.
Scientific American 

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