Restos de espaçonaves, roupa, joia e até bolas de golfe estão entre os objetos mais cobiçados deixados em solo lunar. Trazê-los de volta pode render muito dinheiro, mas coloca em risco nosso conhecimento sobre o satélite.
Quando o astronauta Neil Armstrong tornou-se o primeiro homem a pisar na Lua, em 20 de julho de 1969, ele não apenas proporcionou um grande salto para a humanidade. Sua missão, a Apollo 11, também inaugurou o costume de abandonar objetos criados pelo homem no satélite. As diversas missões de exploração e observação levadas a cabo por Estados Unidos, Rússia, China, Japão e Índia, nas últimas décadas, foram deixando para trás módulos de naves, sondas, equipamentos e objetos de uso pessoal dos astronautas e formando uma espécie de sítio arqueológico espacial em solo lunar.
Alguns desses artefatos são extremamente importantes e úteis até hoje, como os refletores de raios lasers instalados pelas missões Apollo 11, 14 e 15, em 1969 e 1971. “Esses equipamentos refletem luz emitida da Terra e são usados para medir a distância entre o planeta e a Lua e em estudos sobre gravidade”, diz Arlin Crotts, professor de astronomia da Universidade de Columbia, nos EUA. Mas o lixo deixado no satélite também tem a sua importância. “Arqueólogos podem construir todo um quadro a respeito de uma civilização antiga com base nesses resíduos”, diz Jaymie Matthews, professor de astronomia da Universidade de British Columbia, no Canadá. Além disso, esses objetos podem ajudar a responder a algumas questões. Como os materiais aguentaram as condições na Lua? O que o acúmulo de terra neles pode nos dizer sobre o ambiente local a longo prazo? Essas perguntas foram feitas por Bill Barry, historiador-chefe da Nasa, em entrevista à ISTOÉ. “Os restos de espaçonaves e sondas antigas podem produzir conhecimento que nos ajudará a criar equipamentos espaciais que durem mais tempo”, afirma.
O receio desses cientistas é que, com a intensificação de viagens para a Lua, o satélite vire uma terra de ninguém. Com isso, experimentos como o dos refletores podem ser prejudicados, caso os equipamentos sejam manipulados ou mudados de lugar. E a intensificação temida pelos pesquisadores não está nada distante. A China planeja fazer um pouso não tripulado lá até o final deste ano e enviar astronautas até 2015. “Espero que os futuros exploradores tenham cuidado em preservar artefatos históricos, como o primeiro objeto feito pelo homem a pousar no satélite: a nave soviética Luna 2”, afirma Barry.
EFÊMERO
O astronauta Charles Duke deixou uma foto de sua família em solo lunar.
Cientistas suspeitam que a radiação cósmica tenha devorado a imagem
O astronauta Charles Duke deixou uma foto de sua família em solo lunar.
Cientistas suspeitam que a radiação cósmica tenha devorado a imagem
É preciso também cuidado na manipulação desses objetos caso sejam trazidos de volta à Terra para estudos. Em 1969, tripulantes da Apollo 12 coletaram equipamentos de dentro da sonda Surveyor 3, enviada à Lua dois anos antes. Ao chegar aqui, foi constatado que os artefatos estavam contaminados por bactérias do gênero Streptococcus. “Acredita-se que a contaminação tenha ocorrido no laboratório terrestre, onde foram analisados”, diz Arlin Crotts.
Neste momento tramita no Congresso americano um projeto de autoria da deputada Donna Edwards que propõe que os locais de pouso das missões Apollo na Lua sejam transformados em Parques Históricos Nacionais sob jurisdição dos EUA. Mas a legalidade da ideia é colocada em xeque. “Tecnicamente o projeto é inconsistente com o Tratado do Espaço”, afirma Crotts. O acordo foi firmado em 1967 entre Estados Unidos, Reino Unido e União Soviética e já foi assinado por mais 102 nações. Ele estabelece que os corpos celestes são patrimônio da humanidade e não podem ser reivindicados por nenhum país. “Os EUA não podem estabelecer uma reserva na Lua unilateralmente, mas o país poderia liderar um esforço frente às Nações Unidas para estabelecer uma proteção”, diz Jaymie Matthews.
Além da importância científica e histórica, alguns objetos que repousam na Lua despertam curiosidade, como as duas bolas de golfe arremessadas pelo astronauta Alan Shepard, tripulante da Apollo 14. Segundo o que ele disse na volta à Terra, a primeira delas caiu a 40 metros dele, em uma cratera chamada Javelin. A segunda teria ido mais longe: 180 metros, graças à baixa gravidade e à ausência de ar, que poderia oferecer alguma resistência. Se encontradas e trazidas de volta à Terra, essas bolas valeriam milhões. O temor dos cientistas é que esse tipo de raciocínio tome conta dos próximos exploradores da Lua. A esta altura, uma corrida do ouro pode colocar em risco tudo o que tornou possível conhecer melhor o nosso satélite.
Nenhum comentário:
Postar um comentário