terça-feira, 28 de abril de 2015

A ameaça sobre os rios da Amazônia

A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo. Segundo relatório da WWF, nos últimos 4 anos foram descobertas 441 novas espécies na região
 
Além da beleza natural ofuscante, a Amazônia é detentora de números grandiosos. A vegetação da maior floresta tropical do mundo, com aproximadamente 6,5 milhões de km², cobre parte do território de nove países da América do Sul. Mas não é somente mantendo suas árvores em pé que será possível preservar o equilíbrio deste bioma vital para o planeta. É necessário cuidar de suas águas.
A região amazônica possui o maior sistema fluvial do planeta. São mais de 100 mil quilômetros de rios, riachos, igapós, várzeas e outros tipos de áreas alagáveis. Só a foz do Rio Amazonas é responsável por desaguar cerca de 6.700 km³ de água doce por ano no Oceano Atlântico, o que representa quase 20% de todo fluxo global de água fluvial de superfície.
Todavia, muita atenção foi dada ao desmatamento na Amazônia nos últimos anos - algo fundamental e importantíssimo -, mas a proteção de seus rios foi negligenciada. Com o intuito de alertar sobre esta questão, a Iniciativa Amazônia Viva, da organização não-governamental WWF-Internacional, em parceria com suas instituições sulamericanas, lançou na segunda-feira (13) o relatório O Estado da Amazônia: Conectividade e Saúde dos Ecossistemas de Água Doce. O estudo foi divulgado em evento paralelo do VII Fórum Mundial de Água, realizado pelo Conselho Mundial da Água, que acontece em Gyeongju, na Coréia do Sul (de 12 a 17 de abril).
O relatório mostra como a ligação hidrológica da Bacia Amazônica é imprescendível para a sobrevivência de inúmeras espécies. Muitos peixes dependem das migrações laterais ou longitudinais em algumas partes de seus ciclos de vida. É o caso do bagre, por exemplo. A espécie viaja milhares de quilômetros desde o estuário da Amazônia até as cabeceiras dos rios de água branca (barrenta) e deixa suas ovas nos contrafortes dos Andes. Ou seja, o bagre só consegue se reproduzir graças aos chamados corredores de migração.
A conexão entre a água doce da Amazônia também regula o fluxo de material orgânico e inorgânico, necessários para o desenvolvimento da vida aquática e terrestre. Durante épocas de cheias e inundações, sedimentos que são carregados pelo rio influenciam o crescimento de plantas e trazem alimentos para os animais. Alguns rios chegam a subir entre 15 a 20 metros de altura nestes períodos. A floresta Xixuaú, na divisa dos estados de Amazonas e Roraima, depende exatamente deste ciclo para sua preservação.
Equilíbrio ameaçado
Entretanto, todo este equilíbrio harmônico do bioma aquático da Amazônia está sob ameaça. Na região Amazônica (não só no Brasil, mas como em seus vizinhos), atualmente 154 usinas hidrelétricas e barragens estão em funcionamento, outras 21 se encontram em construção e nada menos que 277 novas estão sendo planejadas. Se estas obras forem concretizadas, apenas três rios afluentes do Amazonas manterão seu fluxo livre.
"A eletricidade pode ser importante para o desenvolvimento sustentável da Amazônia. A energia hidrelétrica não é uma energia limpa, mas ela é melhor do que a energia proveniente de combustíveis fósseis e do que a energia nuclear. Mesmo assim, o planejamento e o desenvolvimento hidrelétrico precisam levar em conta que abordagens integradas são viáveis na Amazônia", destaca Claudio Maretti, líder da Iniciativa Amazônia Viva. Segundo ele, o planejamento da geração de energia na Pan-Amazônia deve assegurar a integridade dos ecossistemas, evitar sua fragmentação e manter os serviços ambientais da área, garantindo ainda a salvaguarda dos direitos das populações indígenas e comunidades locais.
Mas o relatório O Estado da Amazônia aponta que a ameaça aos rios não vem apenas da exploração energética da água. A expansão da agricultura e da pecuária, além da mineração, prospecção e exploração de petróleo e gás contribuem cada vez mais para a degradação dos fluxos hidrológicos da Amazônia.
E não é somente a fauna e a flora que sofrem com a falta de políticas públicas de proteção ao ecossistema aquático da maior floresta tropical do planeta. Estima-se que a produção da pesca comercial e de subsistência seja de 425 mil toneladas por ano, fornecendo uma fonte essencial de proteína e renda para as famílias ribeirinhas. A rede hidrográfica é a força motriz da economia regional, suprindo os meios primários de alimentos e produção de energia, transporte e outros serviços, afirma o relatório do WWF.
Além de movimentar a economia local, a água da Amazônia fornece um inigualável serviço ambiental: a bacia hidrográfica devolve à atmosfera aproximadamente 9.600 km3 de água por ano, através do processo de evaporação, responsável pela regulação do ciclo de chuvas não só no norte do Brasil, mas como em outras regiões do país.
O estudo elaborado pelos pesquisadores da Amazônia Viva faz uma série de recomendações para que o desenvolvimento hidrológico da região possa ser feito de forma sustentável e ocorra a mitigação do impacto sobre o bioma. Entre as sugestões estão:
  • adoção de uma visão integrada de desenvolvimento e conservação do meio ambiente
  • demarcação de novas áreas de proteção ambiental, que representam o ecossistema aquático
  • redução de impactos diretos e indiretos provocados por usinas hidrelétricas no bioma de água doce
  • assinatura e ratificação da United Nations Watercourses Convention
  • desenvolvimento de plano estratégico regional para manter a conectividade das montanhas andinas com as planícies amazônicas e todas as cabeceiras de estuário
  • monitoramento dos impactos das usinas hidrelétricas sobre o ecossistema de água doce, atividades de subsistência e bem-estar das pessoas
  • coleta de melhores informações científicas sobre a migração de peixes e apoio à instituições e organizações de pesquisa que tenham a Amazônia como foco de estudo
  • garantir a segurança alimentar, energética e hídrica das comunidades amazônicas
  • assegurar a participação democráticas das populações locais nos debates para tomada de decisão
  • respeitar o direitos dos povos indígenas e outras comunidades tradicionais à água, terra e demais recursos naturais.

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