A elevação das temperaturas do planeta, acompanhada de eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, parece ser mesmo uma tendência inexorável. E o Brasil é um dos países mais atingidos. Novo relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) divulgado nesta quarta-feira classifica como “muito provável” - o que significa uma probabilidade de 90% a 100% - o aumento de dias e noites quentes e a redução dos dias e noites mais frios em todo o mundo ao longo do próximo século. No Brasil, dias com temperaturas mais elevadas serão de 10% a 15% mais frequentes; enquanto as noites, especialmente no Sul e no Sudeste, ficarão até 25% mais quentes.
- O relatório confirma a tendência de aumento das temperaturas que vemos desde 1950 e mostra que variações climáticas não são tão naturais assim, que a interferência do homem nesses processos é provável - afirmou o especialista José Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), um dos autores do relatório, que está em Londres participando da conferência Planeta sob Pressão. - A mão do homem começa a aparecer.
Os especialistas ressaltam que a tendência de aquecimento é global. Os dias mais quentes deverão se tornar mais frequentes.
- Um dia muito quente, que costuma acontecer uma vez a cada 20 anos, deve se tornar um evento bienal na maior parte do planeta -- afirmou a especialista em clima Sonia Seneviratne, do Instituto Federal de Tecnologia da Suíça, que também participa da conferência e é outra integrante do grupo responsável pela elaboração do relatório sobre eventos extremos.
O documento mostra ainda que as secas devem se tornar mais comuns. O Nordeste brasileiro é um dos locais mais atingidos, ao lado de América Central, México, Europa Mediterrânea, norte da África, África do Sul e Austrália.
- O Nordeste hoje é considerada uma região semiárida, o que quer dizer que chove em metade do ano - explicou Marengo. -- Mas, com o aquecimento, juntamente com a degradação dos solos pela agricultura e a pecuária, há um aumento do risco de desertificação.
Segundo o especialista, a desertificação do Nordeste aparece em mais modelos do que a anteriormente tão propalada savanização da Amazônia. Outra tendência relacionada ao Brasil que aparece com força no novo relatório é o aumento das chuvas no Sul do país, mais precisamente na área da Bacia do Prata. Em todo o planeta, a incidência de chuvas intensas deve ser mais frequente. Eventos que ocorriam a cada 20 anos podem passar a acontecer numa escala de tempo menor, de 5 a 15 anos. A frequência de ciclones tropicais deve se manter a mesma, mas o número de tempestades mais violentas, com velocidade máxima de ventos, tende a aumentar.
Esta é a primeira vez que um relatório feito por um único grupo de cientistas reúne todo o conhecimento disponível em eventos extremos, como elevação de temperaturas, chuvas intensas e secas, e também no que diz respeito a adaptação e prevenção para 26 regiões do planeta. De acordo com o IPCC, o documento, que fará parte do quinto relatório, a ser lançado em abril, oferece “um nível inédito de detalhes sobre eventos climáticos extremos baseado em uma ampla análise de mais de mil estudos científicos”.
Segundo Marengo, o novo documento aprofunda algumas tendências apontadas pelo quarto relatório do IPCC, divulgado em 2007.
- Ele mostra uma piora em algumas áreas que não foram muito destacadas no relatório anterior - afirmou.O relatório sobre eventos extremos destaca ainda que políticas de prevenção e adaptação podem reduzir os impactos de tais eventos e aumentar a proteção das populações mais vulneráveis.
- A adaptação é a única forma, não dá mais para mudarmos o clima - disse Marengo.
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