Ao tuitar ou comentar embaixo do post de um de seus vários
amigos no Facebook, você provavelmente se sente privilegiado por viver em um
tempo na História em que é possível alcançar de forma imediata uma vasta rede de
contatos por meio de um simples clique no botão "enviar".
Você talvez também reflita sobre como as gerações passadas puderam viver sem
mídias sociais, desprovidas da capacidade de verem e serem vistas, de receber,
gerar e interagir com uma imensa carga de informações.
Mas o que você talvez não sabia, é que os seres humanos usam ferramentas de
interação social há mais de dois mil anos. É o que afirma Tom Standage, autor do
livro Writing on the Wall – Social Media, The first 2.000 Years
(Escrevendo no Mural - Mídias Sociais, Os primeiros 2 mil anos, em tradução
livre).
Na obra, Standage, que é editor de conteúdo do site da revista britânica
The Economist, afirma que redes sociais como o Facebook, Twitter e
Tumblr podem ser as últimas encarnações de uma prática que começou por volta do
ano 51 a.C, na Roma Antiga.
Segundo Standage, Marco Túlio Cícero, filósofo e político romano, teria sido,
junto com outros membros da elite romana, precursor do uso de redes sociais.
O autor relata como Cícero usava um escravo, que posteriormente tornou-se seu
escriba, para redigir mensagens em rolos de papiro que eram enviados a uma
espécie de rede de contatos.
Estas pessoas, por sua vez, copiavam seu texto, acrescentavam seus próprios
comentários e repassavam adiante.
"Hoje temos computadores e banda larga, mas os romanos tinham escravos e
escribas que transmitiam suas mensagens", disse Standage à BBC Brasil.
"Membros da elite romana escreviam entre si constantemente, comentando sobre
as últimas movimentações políticas e expressando opiniões".
iPad romano
Além do papiro, outra plataforma comumente utilizada pelos romanos era uma
tábua de cera do tamanho e forma de um tablet moderno, em que escreviam recados,
perguntas ou transmitiam os principais pontos da acta diurna, um
"jornal" exposto diariamente no Fórum de Roma contendo um resumo de debates
políticos, anúncios de feriados, de nascimentos e de óbitos, e outras
informações oficiais.
Essa tábua, o "iPad da Roma Antiga", era levado por um mensageiro até o
destinatário, que respondia embaixo da mensagem.
"Esse sistema é provavelmente o antepassado mais antigo do torpedo de
celular", compara o autor.
Outra curiosidade relatada no livro é que o hábito de abreviar palavras e
expressões, amplamente usado nos dias de hoje, também era comum entre os
romanos.
Entre as expressões mais correntes estavam "SPD", que significa "Envia muitos
cumprimentos" e S.V.B.E.E.V: "Se você está bem, que bom. Eu estou bem".
Escrevendo no Mural descreve a evolução das mídias sociais ao longo
da História e mostram o grande impacto da criação do papel e da invenção do
processo de impressão sobre a comunicação social.
"Na corte de Ana Bolena (uma das mulheres do rei da Inglaterra Henrique 8º),
o manuscrito de Devonshire era um Facebook do século 16, permitindo aos
cortesãos se comunicarem por meio de poesias e fofocas nas páginas que circulavam pelos corredores do palácio", diz o autor.
Standage conta como os panfletos do teólogo alemão Martinho Lutero, que
desencadearam a Reforma Protestante no século 16, foram disseminados rapidamente
pela Europa depois que as pessoas começaram a replicá-los e, depois,
imprimi-los.
"Ele não esperava que isso fosse acontecer, que as pessoas fossem disseminar
sua mensagem de que a Igreja precisava ser reformada. Foi uma disseminação
social e viral", diz o autor.
Anomalia histórica
Para o Standage, o advento e a popularização da comunicação de massa no
século 19 — com jornais e livros — e no século 20 — cinema, rádio e TV —
ofuscaram os modelos sociais de distribuição de informação que haviam
prevalecido durante séculos.
"As pessoas passaram a obter informações das mídias de massa e não mais de
seus amigos, em um processo de mão única, sem interação", diz o autor.
Na última década, a internet abriu caminho para o renascimento das
plataformas sociais de comunicação que, para o autor, se tornaram tão eficientes
que passaram a competir com as mídias de massa.
"Agora o grande desafio das grandes organizações de mídia é gerar conteúdo de
mão dupla, porque já sabem que o de mão única foi uma anomalia histórica que não
funciona mais".
Para Standage, sua obra reflete que o ser humano, independentemente da época
em que vive, nutre o desejo profundo de se conectar e compartilhar ideias e
impressões com outras pessoas.
"Este desejo é construído nos nossos cérebros. A tecnologia vai e vem, mas a
natureza humana continua a mesma".
BBC
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