domingo, 31 de março de 2013

É possível transportar um iceberg?

A água será o ouro de 2050 e a sua escassez uma provável fonte de conflitos. Há muitos anos os cientistas se propõem a conseguir água potável a um preço razoável e, neste sentido, os pesquisadores da Iceberg Transport International pretendem levar blocos imensos de gelo a áreas com necessidade de água.
Na atualidade cerca de um bilhão de pessoas não têm acesso à água potável e este problema afeta também regiões desenvolvidas como a Europa, onde 20% da população sofre com sua escassez. Perante este problema, o explorador francês, Paul Emile Victor, e o engenheiro da mesma nacionalidade, Georges Mougin, encorajados pelo príncipe saudita Mohammed al Faisal al Saud, começaram a estudar a viabilidade de levar um iceberg até o deserto e, em 1976, fundaram a empresa Iceberg Transport International.
Esta ideia, que muitos consideram maluca, parte do princípio que as geleiras que existem nas áreas mais frias do planeta, próximas dos polos, são de água potável e todas se fundem no mar, todos os anos, derretendo uma quantidade de água doce equivalente à que é consumida no mundo nesse mesmo período. A cada temporada, 40 mil icebergs flutuam no mar. Além disso, estes blocos de gelo guardam muita energia.
O problema principal era como transportar de forma eficiente uma imensa massa de gelo, como reagir perante sua fratura, qual seria o tamanho ideal e como evitar que se derreta durante o transporte.
Tudo isso devia ser calculado sob condições meteorológicas específicas, chegando à conclusão que testá-la seria muito custoso e, por isso, a ideia foi deixada de lado durante muitos anos.
Novas tecnologias resgatam o projeto
Porém, a tecnologia evoluiu de forma vertiginosa e a simulação em três dimensões (3D), que está plenamente vigente, resultou ser um grande apoio para esta ideia "maluca".
Com esta ajuda, a iniciativa deixou de ser um projeto com necessidade de testes reais, com um custo que fontes da Iceberg Transport International taxavam em 8 milhões de euros, e hoje pode sair do papel através da simulação 3D, com um custo insignificante.
Foi a multinacional de software Dessault Systemes que decidiu retomar a ideia em 2009, contando com um dos pais do projeto, Georges Mougin, e com o especialista em navegação, François Mauvel.
 
Mougin já sabia que a fusão de um metro cúbico de gelo pode produzir cinco quilowatts/hora de eletricidade. Seu calor latente atua como fonte de frio de uma usina de energia térmica oceânica e a água extremamente fria obtida pode fornecer um sistema de ar condicionado. Desta forma, a energia guardada representa um valor 20 vezes superior à energia consumida em sua transferência.
 
Mauvel decidiu, após os estudos preliminares, que seria preciso transferir um iceberg de sete milhões de toneladas e com forma de tubo, já que é mais estável e regular, e apresenta um mínimo risco de fratura durante o transporte, mas seria necessário protegê-lo com um material geotêxtil para isolá-lo e evitar uma fusão rápida.
Optou-se então por estudar o transporte da massa de gelo de Terranova (na costa do Canadá) às Ilhas Canárias (sudoeste da Espanha, em frente ao litoral ocidental da África), onde há necessidade de água potável e que é utilizada normalmente como dessalinizadora.
As simulações foram realizadas com dados reais utilizando fotos, vídeos, estudos econômicos e instalando um radar para os icebergs em frente à costa de Terranova. O iceberg 3D eleito pesava sete milhões de toneladas, tinha 163 metros de altura, 236 de comprimento e 189 de largura.
Foram utilizados dados meteorológicos e oceanográficos gravados durante um ano para o teste, que, por sua vez, foi somada a simulações hidráulicas e térmicas.
Dessa forma, observou-se que a fusão de gelo mais rápida ocorre nas esquinas e nas zonas das paredes verticais com cavidades profundas, o que permitiu refinar o projeto de construção do sistema de proteção do iceberg.
Com poucos cliques puderam escolher as melhores datas para fazer o transporte, o número de rebocadores que seriam necessários, e a estratégia geral. O resultado é que na transferência se perderia 38% da massa do iceberg e que a viagem durará 141 dias, a uma velocidade de 1,8 km/h.
Para otimizar a economia de energia será preciso recorrer à indústria barqueira para construir duas embarcações que possam mover o iceberg, ou seja que tenham a potência suficiente, mas que não desenvolvam muita velocidade.
A experiência virtual mostrou aos analistas que usar mais navios só contribuiria para um maior consumo energético e se ganharia pouco tempo, já que neste tipo de transporte o efeito inércia é muito importante na hora de movimentar a grande massa de gelo.
Esta simulação permitiu estudar todos os desafios da viagem, da mesma forma como na atualidade se desenvolve um carro ou uma máquina e se testa virtualmente antes de levá-la à prática.
Georges Mougin está agora muito perto de ver realizado seu sonho, embora ainda nenhum governo tenha pedido informação adicional sobre o projeto e sejam necessários novos estudos econômicos nesta época de crise.

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