sexta-feira, 26 de abril de 2013

À beira do abismo climático

Enquanto governos e diplomatas não se entendem nas negociações climáticas globais, o mundo se aproxima perigosamente de um ponto na concentração de apenas um dos gases do efeito estufa na atmosfera que muitos cientistas acreditam que torna inevitável um aumento de pelo menos 2 graus Celsius na temperatura média da Terra, com graves consequências para a vida no planeta. Uma estação de monitoramento no topo da montanha Mauna Loa, no Havaí, deverá registrar pela primeira vez em maio um índice de 400 partes por milhão (ppm) de dióxido de carbono (CO2) no ar do Hemisfério Norte. A estação funciona desde 1958 e seu índice, conhecido como “Curva de Keeling”, é o mais longo registro ininterrupto da concentração do gás na atmosfera, sendo, por isso, considerado um padrão que é acompanhado de perto por cientistas climáticos de todo o mundo.
O limite em que hipoteticamente o aquecimento seria inevitável - de 400 ppm de CO2 equivalente, pois leva em conta também outros gases-estufa, como o metano e o ozônio - emergiu de modelos climáticos que servem de base para as discussões do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC), que, por sua vez, norteiam as negociações diplomáticas sobre o corte nas emissões de poluentes que contribuem para o fenômeno. Segundo os cientistas, a última vez que a concentração de gases do efeito estufa na atmosfera atingiu tal nível foi na época do Plioceno, entre 3,2 milhões e 5 milhões de anos atrás, quando o clima na Terra era de 2 a 3 graus Celsius mais quente do que hoje e o nível do mar 25 metros mais alto. Estima-se que há 200 anos, no início da Revolução Industrial, esta concentração estava em cerca de 280 ppm.
- Enquanto ficamos só falando, o mundo não espera e continua caminhando para concentrações cada vez mais altas de gases do efeito estufa na atmosfera - alerta Ralph Keeling, geofísico do Instituto Scripps de Oceanografia da Universidade da Califórnia em San Diego e filho de Charles David Keeling, pioneiro no estudo dos gases-estufa e seus efeitos no clima global e responsável pela implantação da estação de monitoramento do Havaí. - O índice está se movendo tão rápido que vai chegar aos 400 ppm até o mês que vem e a concentração não vai parar por aí. As emissões de gases-estufa estão atingindo níveis recordes e os esforços para cortá-las não estão tendo resultados.
Esperança de impulso nas negociações
Segundo Keeling, dado o ritmo atual e a falta de medidas práticas para reduzir as emissões de gases-estufa, a curva que leva seu nome e do seu pai chegará a 450 ppm em no máximo duas décadas, avançando para 500 ppm em mais outros 20 anos. A este nível, alguns dos modelos climáticos usados pelo IPCC chegam a apontar um aumento de 6 ou mais graus Celsius na temperatura média global, com efeitos catastróficos que serão sentidos em todo o planeta.
- Certamente não é impossível para os seres humanos mudarem o planeta de uma maneira tão radical - diz o pesquisador. - E embora não saibamos se os 400 ppm são de fato o limite exato para um aquecimento inevitável, é um número para chamar a atenção de todos. Para pararmos e pensarmos sobre o que estamos fazendo com o planeta. Creio que, mesmo daqui a muitos anos, as pessoas que estão vivas hoje vão se lembrar de quando este índice foi ultrapassado. Ele será uma marca histórica
Diante disso, Keeling também espera que o recorde na concentração de CO2 sirva para dar um novo impulso nas negociações globais sobre o clima, seja diretamente, como um alerta para os governantes, ou indiretamente, por meio da pressão da opinião pública:
- O primeiro passo para uma atitude responsável é o conhecimento. A Terra está mudando e não podemos mais ficar só nas palavras.



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