sexta-feira, 7 de março de 2014

Os confins do Sistema Solar


Ao final de uma viagem de 8 anos, um mês e 16 dias pelo espaço interplanetário a missão New Horizons chega ao seu alvo, o antigo planeta Plutão, agora reclassificado para planeta-anão Plutão, em 14 de julho do próximo ano.
Ao chegar ao destino, a New Horizons será primeira missão a examinar as bordas internas do Sistema Solar, desde que Plutão foi identificado pelo astrônomo amador americano Clyde Tombaugh, em 18 de fevereiro de 1930, ao final de um exaustivo processo de análise fotográfica com o recurso de um instrumento chamado cintilador. (http://goo.gl/tgzVLU) 
À época em que fez a descoberta do que durante décadas foi o planeta mais externo do Sistema Solar (ainda que devido à sua órbita altamente elíptica, temporariamente Plutão fique mais próximo do Sol que Netuno), os computadores que hoje executariam essa tarefa num piscar de olhos eram realizações do futuro.
A descoberta de objetos transnetunianos, ou transplutaniano, como o corpo 1992 QB1, o primeiro depois do próprio Plutão, foi possível pelo refinamento das observações astronômicas com equipamentos mais eficientes, como as câmeras CCD que aumentaram a sensibilidade dos registros fotográficos, coisa que os antigos filmes recoberto com sais de prata não podiam fazer.
Em Plutão a New Horizons deverá investigar e classificar a geologia e morfologia de Plutão e seu sistema de luas: Caronte, Nix, Hydra, Cérbero e Estige, entre as já conhecidas. E a perspectiva, como já ocorreu em mundos como Júpiter e Saturno, é que novas luas sejam identificadas.
Entre os objetivos secundários da missão está a investigação da atmosfera de Plutão e de Caronte, sua lua principal e a primeira a ser conhecida. Uma área de interesse particular no caso da atmosfera desses mundos é a interação que exibem com o vento solar, a chuva de partículas emitidas pelo Sol, em especial no pico de explosões, como ocorre agora e que inunda todo o Sistema Solar.
Limites do reino do Sol
Conhecer as fronteiras do reino do Sol, o que inclui o Cinturão de Kuiper, entulhos que sobraram da formação do Sistema Solar, e além dessa faixa mesmo a Nuvem Oort, são explorações indispensáveis para se desvendar em escala inédita a historia da sua formação, há uns 5 bilhões de anos, quando a própria galáxia, a Via Láctea, tinha pouco mais da metade da idade que exibe hoje.
A Nuvem Oort, referida de maneira algo sumária, é um berçário de cometas que, sob a ação gravitacional de estrelas próximas, dispara bólidos que podem tanto desprender-se em direção ao espaço profundo, em direção ao reino de outras estrelas, quanto encaminhar-se em direção ao Sol. Neste caso, dependendo da orbita que desenham, tanto podem fazer uma única visita à nossa estrela-mãe quanto serem capturados gravitacionalmente e se tornarem cometas periódicos.
Lançada em 19 de janeiro de 2006, a missão New Horizons viajou rumo a Plutão impulsionada tanto por foguetes químicos quanto pela técnica chamada de gravidade assistida. Neste caso, uma nave se vale da atração gravitacional de planetas ao longo da rota que deve percorrer “roubando” energia de cada um deles para deslocar-se.
Um sinal de rádio enviado da Terra em direção à nave demora pouco mais de 4 horas para chegar até ela e levar informações para um determinado comando, daí os computadores de bordo estarem programados para tarefas mais imediatas, sem tempo de serem transmitidas da Terra.
O descompasso do tempo em relação a uma nave nos confins do Sistema Solar, como ocorre com a missão New Horizons, é uma espécie de anúncio de uma época em que mesmo a velocidade da luz, o limite de transmissão de informação em nosso universo, terá a velocidade comparativa de uma carroça, no início do século passado.
Mas a viagem a esse mundo distante pode surpreender de muitas outras maneiras. A ciência não é uma atividade que possa ser desempenhada com base em algo como o bom senso. Ao contrário disso, a ciência é fundamentalmente um encontro com o desconhecido e, neste sentido, uma experiência profunda de estranhamento.
Ciência romântica
Em relação a Plutão, um enorme conjunto de considerações pode ser feito, a começar pelo seu descobridor, o simpaticíssimo Clyde Tombaugh, morto em 17 de janeiro de 1997, aos 90 anos, na localidade de Las Cruces, no Novo México.
Tombaugh teve interações próximas com astrônomos importantes de sua época, caso de Vesto Melvin Slipher (1875-1969), diretor do Observatório Lowell, em Flagstaff, no Arizona, de onde localizou Plutão.
E o próprio Percival Lowell (1855-1916), fundador do Observatório que leva seu nome foi responsável por boa parte da popularização da idéia de que Marte dispunha de canais artificiais e portanto era ocupada por criaturas inteligentes.
Slipher, por exemplo, é o verdadeiro mentor da idéia de um universo em expansão, de que Edwin Hubble tomou conhecimento em uma palestra em que o diretor do Observatório Lowell expôs suas idéias.
Hubble ficou com todo o crédito da descoberta quando, na verdade, tem o mérito de, em parceria com um ex-carroceiro, Milton Humason, ter feito as medidas da expansão cósmica, à época conhecida como fuga das galáxias.
Assim, de alguma maneira, a missão New Horizons remete a uma época de astrônomos individuais, quase heróis românticos, hoje substituídos pela chamada big science, equipes que podem ter dezenas de participantes, ainda que dirigidas por um líder.
Scientific American

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