quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Em busca dos mistérios da antimatéria


Instalações da colaboração Alpha no Cern: carga do anti-hidrogênio é neutra até o bilionésimo da carga do elétron
Foto: Cern
 
De acordo com as teorias mais aceitas atualmente, o Big Bang, a grande explosão que se acredita ter dado origem ao nosso Universo há cerca de 13,8 bilhões de anos, deveria ter criado quantidades iguais de matéria e antimatéria que logo se aniquilariam mutuamente, deixando para trás um deserto de energia. Mas nós, e todos os planetas, estrelas e galáxias, aqui estamos, então algo aconteceu para que houvesse uma assimetria na formação ou interação da matéria e da antimatéria na origem do Cosmo. A causa disso é um dos maiores mistérios da ciência hoje, e novas medidas da neutralidade da carga elétrica do anti-hidrogênio, feitas por pesquisadores no Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (Cern), aprofundam ainda mais a questão.
Espelho da matéria “comum” da qual somos feitos, a antimatéria, também segundo a teoria mais aceita hoje — o chamado Modelo Padrão da física de partículas —, deve ter propriedades iguais a ela, mas com algumas características trocadas. Assim, ao próton, de carga positiva, se contrapõe o antipróton, com carga negativa, enquanto ao elétron, negativo, temos o pósitron, positivo. E, assim como um próton e um elétron formam um átomo neutro de hidrogênio, um antipróton e um pósitron compõem um átomo de anti-hidrogênio, também teoricamente neutro.
Neutro ao bilionésimo
Apenas recentemente, porém, a Humanidade conquistou a capacidade de produzir esses antiátomos e capturá-los para estudá-los. E, de acordo com as últimas medições feitas no Cern, com uma precisão 20 vezes superior às anteriores, o anti-hidrogênio é de fato neutro até o limite de 0,7 parte por bilhão da carga elementar do elétron.
— Esta igualdade na neutralidade da carga do hidrogênio e do anti-hidrogênio é prevista na teoria, então, de qualquer forma, não esperávamos ver uma diferença, mesmo neste nível de precisão — conta Claudio Lenz Cesar, professor do Instituto de Física de UFRJ e um dos três brasileiros da
instituição que integram a colaboração Alpha, o grupo de cientistas responsável pelas últimas medições, publicadas esta semana na revista “Nature”. — Mas, como físicos experimentais, é nossa obrigação testar e medir tudo com a maior precisão possível. Ainda mais porque, se a neutralidade da carga do hidrogênio e do anti-hidrogênio for realmente igual, continuamos sem ter uma explicação para a assimetria entre matéria e antimatéria no Universo e o mistério continua.
Os cientistas, no entanto, ainda estão longe de desistir de encontrar alguma diferença nas propriedades da antimatéria que possa justificar sua ausência no Universo que vivemos na sua forma primordial, isto é, a que se supõe ter sido criada no Big Bang. Além de planos para estudar em ainda mais detalhes a carga do anti-hidrogênio este ano, chegando ao nível quântico, os pesquisadores da colaboração no Cern pretendem verificar outros parâmetros, como, por exemplo, se a antimatéria “sente” a ação da gravidade da mesma maneira que a matéria “comum”, assim como se as linhas de emissão do anti-hidrogênio no espectro eletromagnético, isto é, sua “cor” e amplitude, são iguais às do hidrogênio.
Qualquer variação nestas propriedades, mesmo que muito pequena, pode ter implicações tão gigantescas na escala cósmica que explicariam por que a
matéria comum predomina no Universo. Por outro lado, Cesar lembra que mesmo se não for encontrada diferença alguma nelas, ainda assim isso será um grande avanço para a ciência ao obrigar uma revisão geral das principais teorias cosmológicas atuais.
— Isso será uma enorme revolução na física, inclusive pelo potencial de derrubar alguns dos principais dogmas da Relatividade Geral, que até agora se mostrou precisa em todas suas previsões sobre como se comporta nosso Universo em grande escala — conclui.
O Globo.com
 









 

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