sexta-feira, 31 de março de 2017

Vento solar comeu a atmosfera de Marte

A imagem da direita mostra o planeta coberto por uma enorme tempestade de areia.
Houve um dia em que a água em estado líquido cobria a superfície de Marte. Isso é o que sugere a informação coletada pelas sondas que visitaram aquele planeta. Foram encontrados ali leitos de rios secos e minerais que só são formados na presença de água. Alguns estudos chegaram a afirmar que houve um vasto oceano pouco profundo que ocupava grande parte do globo e até mesmo que aconteciam tsunamis gigantes. Mas reconstruir o que aconteceu há bilhões de anos em um planeta que está a milhões de quilômetros de distância não é fácil e existem contradições. Se em dezembro de 2016, os dados da NASA serviam para afirmar que a água marciana era temperada e poderia ter abrigado vida, outro mais recente que também usou informações coletadas pelo robô Curiositycoincidia na abundância de água, mas acreditava que estaria, na maior parte, congelada.
Nesse processo de reconstrução da história do clima do planeta do sistema solar mais parecido com a Terra, esta semana, um artigo na revista Science tenta explicar o que aconteceu entre aquele passado banhado em água e o deserto avermelhado que conhecemos hoje. De acordo com uma equipe liderada por Bruce Jakosky, pesquisador da Universidade do Colorado em Boulder (EUA), em seu passado remoto, Marte tinha uma atmosfera densa similar à da Terra, mas composta principalmente por dióxido de carbono. Aquele manto permitiu a existência de um ambiente quente e úmido, com os oceanos que outros pesquisadores acreditam prováveis, e seu desaparecimento foi fundamental para a transição ao ambiente seco e frio atual. O culpado foi o vento solar, uma corrente de partículas carregadas que flui da superfície do sol e foi erodindo a atmosfera.
sonda que forneceu os novos dados é a MAVEN, uma missão orbital concebida precisamente para conhecer a história dessa atmosfera volátil. Graças a ela sabemos há dois anos que a cada segundo o vento solar raspa 100 gramas da atmosfera de Marte. Uma parte importante do interesse nesse observatório está em sua capacidade de fornecer informações sobre como evoluíram as condições de habitabilidade do planeta vermelho. O estudo mais recente pinta um cenário no qual algum tipo de vida bacteriana pode ter surgido naquele ambientebanhado em água e coberto por dióxido de carbono. Depois, quando o planeta se tornou mais frio e seco, é possível que esses seres se retirassem gradualmente para o subsolo, mas não está descartado que hoje possam até aparecer ocasionalmente na superfície.
Jakosky e seus colegas chegaram a essas conclusões depois de medir a quantidade de duas versões de argônio com diferente massa em diferentes altitudes na atmosfera. O interesse no argônio para os cientistas vem de sua natureza como gás nobre. Ao contrário de outros gases, não reage quimicamente com outros elementos e não fica sequestrado nas rochas. Desaparece apenas com os sopros do vento solar.

Esta foi a primeira foto tirada de Marte há 40 anos

Vento solar comeu a atmosfera de Marte
O isótopo mais leve (AR36) é mais abundante a altitudes elevadas que o mais pesado (AR38). Por isso, está mais exposto a que o vento solar o expulse para o espaço exterior. Sabendo as diferentes quantidades dos dois isótopos em diferentes altitudes, e contando os diferentes ritmos de desaparecimento de cada um, calcularam que 66% do argônio de Marte desapareceu desde sua formação. A partir desses dados, estimaram qual parte do resto da atmosfera também acabou sendo varrida pelo vento solar.
Uma das explicações oferecida para a perda precoce da atmosfera marciana e sua mudança climática extrema é o desaparecimento de seu campo magnético. Nos primeiros milhões de anos de existência, Marte tinha um núcleo de ferro como o que a Terra ainda conserva e gera a magnetosfera, um escudo magnético que repele as partículas carregadas do vento solar. Esse escudo também dificulta que o vento solar afete nossa atmosfera e pode ter cumprido esse papel durante os primeiros 500 milhões de anos marcianos. No entanto, de acordo com essa hipótese, o núcleo de ferro desapareceu e com ele o escudo magnético. Sem essa proteção, a então espessa atmosfera de dióxido de carbono de Marte ficou à mercê do vento solar. (El País.com)

Escócia pede formalmente a Londres novo referendo sobre independência

Resultado de imagem para foto do governo da Escócia

O Governo da Escócia pediu formalmente nesta sexta-feira ao Executivo britânico autorização para realizar um segundo referendo sobre a independência do país, alegando que os escoceses devem ter o direito “de escolher o seu próprio futuro”. A primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon, enviou uma carta a Downing Street, residência e gabinete oficial da primeira-ministra conservadora, Theresa May, em que reivindica a realização de um novo plebiscito diante da iminente retirada do Reino Unido “não só da União Europeia, mas também do mercado comum”, desfecho pelo qual a população escocesa “não votou”.
 carta chega a Downing Street logo depois de o Parlamento autônomo de Holyrood (Edimburgo) ter aprovado, na última terça-feira, um dia antes do início formal do processo do Brexituma moção que insta o Governo escocês a iniciar uma negociação com May. A primeira-ministra britânica disse que, na sua avaliação, este “não é o momento” para a realização de um outro referendo sobre a independência. “Não existe nenhum motivo racional para que a senhora tente se impor à vontade do Parlamento escocês, e espero que não o faça”, escreveu Sturgeon. “De toda forma, em antecipação a uma possível negativa sua de abrir negociações, é importante que eu deixe clara a minha posição”, acrescentou.

Poluição gerada pelas fábricas mata mais de 100.000 chineses por ano


poluição na China Comprar produtos feitos na China sai muito barato para moradores dos países ricos e terrivelmente caro para os chineses. A enorme poluição atmosférica gerada pela indústria chinesa, e deslocada pelo vento, está associada a mais de 3.100 mortes prematuras por ano na EuropaOcidental e nos Estados Unidos, de acordo com um novo estudo internacional. No entanto, o consumo voraz de produtos chineses na UE e nos EUA está ligado a cerca de quase 110.000 mortes prematuras por ano na China pela poluição do ar causada pela produção. Os moradores dos países ricos têm computadorescelulares e brinquedos baratos, e as multinacionais ganham mais dinheiro, mas em troca de centenas de milhares de mortes prematuras na China.
O novo estudo, liderado pelo economista Dabo Guan, é o primeiro a calcular os impactos na saúde transfronteiriça do comércio internacional e da poluição atmosférica deslocada. O trabalho, publicado na quarta-feira na revistaNature, utiliza dados de poluição por partículas finas (PM2,5), tomados em 2007 em todo o mundo. Essas partículas, com menos de 2,5 milésimos de milímetro, penetram no mais profundo dos pulmões, os alvéolos, e podem atingir a corrente sanguínea, provocando doenças respiratórias e cardiovasculares.
Dos 3,45 milhões de mortes prematuras relacionadas com esse tipo de poluição naquele ano, cerca de 12% (411.000) estavam relacionadas com poluentes atmosféricos emitidos em outra região do planeta. E os autores vinculam 22% das mortes (762.400) à produção de bens e serviços em uma região para serem consumidos em outra e as universidades de Princeton e Pequim.
“Se o preço dos produtos importados é baixo porque nas regiões de produção as leis contra a poluição são menos rigorosas, então a poupança dos consumidores poderia estar sendo gerada às custas de vidas perdidas em outras regiões”, dizem abertamente os autores na revista Nature. Estudos anteriores calculam que, no mundo, 90% das mortes prematuras devido à poluição atmosférica são causadas pela PM2,5.
“Nosso estudo calcula até que ponto a poluição do ar é um problema global em uma economia global”, explica Qiang Zhang, pesquisador especialista em química atmosférica da Universidade Qinghua, em Pequim pesquisador. “Os países desenvolvidos deveriam incentivar o consumo responsável para mitigar os efeitos negativos sobre o meio ambiente. E os países em desenvolvimento deveriam melhorar a eficiência de suas economias para reduzir as emissões locais”, propõe Zhang.
O físico Julio Díaz, autor de numerosos estudos sobre a poluição na Espanha, aplaude o novo estudo, mas alerta sobre suas “limitações próprias de um trabalho global”. A pesquisa conduzida por Guan, como destaca Díaz não calculou a dose de poluição necessária para provocar efeitos sobre a saúde em cada região, por exemplo, dependendo das diferentes pirâmides de população. O estudo de Guan extrapola através de estudos anteriores. “Não deixa de ser um modelo informático aproximado de emissões e de carga de doença”, adverte Diaz. (El País.com)

Cobertor sai voando da ISS e fica perdido no espaço

Caminhada espacial na ISS
Um tipo de “cobertor espacial” escapou das mãos da astronauta americana Peggy Wilson enquanto ela fazia uma caminhada no exterior da Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês), na última quinta-feira e foi perdido no espaço. O acidente ocorreu enquanto a astronauta – que se tornou a mulher com mais saídas ao espaço – tentava dobrar a volumosa capa, chamada escudo axial, para colocá-la em um saco.
O “cobertor”, que funcionaria como uma proteção térmica em um dos módulos da ISS, saiu flutuando e causou preocupação no centro de comando da Nasa em Houston, nos Estados Unidos. O temor dos astrônomos é que a capa pudesse voltar inadvertidamente e atingir a Estação – o que não aconteceu.
Cerca de quatro horas depois do início da caminhada espacial, a Nasa comunicou que o cobertor tinha sido realmente perdido e estava a uma distância segura da ISS. Segundo as informações da agência espacial americana, o cobertor perdido, que fazia parte de um conjunto de quatro capas que seriam instaladas durante a saída ao espaço, foi substituído por uma proteção que havia sido removida.

Mulher com mais saídas no espaço

Astronauta americana Peggy Whitson
Astronauta americana Peggy Whitson (Divulgação/Nasa/VEJA.com)
A caminhada dos astronautas Shane Kimbrough e Peggy Whitson começou às 7h29 (8h29 no horário de Brasília) e foi encerrada sete horas depois. A tarefa dos astronautas era fazer alguns ajustes na ISS para a chegada de módulos espaciais comerciais, que devem acontecer nos próximos anos.
Com essa saída, a americana Whitson se tornou a mulher com mais saídas espaciais – ela superou o recorde da astronauta americana Sunita Williams, com sete caminhadas espaciais, e a superou no período em que passou no espaço: 53 horas e 25 minutos.
Whitson foi a primeira mulher a comandar a estação espacial, em 2008, e é astronauta americana com mais idade a ir ao espaço. Em 24 de abril a astronauta deve quebrar outro recorde, o de dias acumulados no espaço por um americano, ao completar 534 dias em órbita, mais que seu colega Jeff Williams. (Veja.com)

Como as raízes do cerrado levam água a torneiras de todas as regiões do Brasil

O rio São Francisco está secando, haverá cada vez menos água em Brasília e a cidade de São Paulo terá de aprender a conviver com racionamentos.
O alerta é do arqueólogo e antropólogo baiano Altair Sales Barbosa, que há quase 50 anos estuda o papel do Cerrado na regulação de grandes rios da América do Sul.
Ele diz à BBC Brasil que a rápida destruição do bioma está golpeando um dos pilares do sistema: a gigantesca rede de raízes que atua como uma esponja, ajudando a recarregar os aquíferos que levam água a torneiras de todas as regiões do Brasil.
Formado em antropologia pela Universidade Católica do Chile, doutor em arqueologia pré-histórica pelo Museu de História Natural de Washington e professor aposentado da PUC-Goiás, Barbosa conta que a água que alimenta o São Francisco e as represas de São Paulo e Brasília vem de três grandes depósitos subterrâneos no Cerrado: os aquíferos Guarani, Urucuia e Bambuí.
Os aquíferos são reabastecidos pela chuva, mas dependem da vegetação para que a água chegue lá embaixo.
Barbosa afirma que muitas plantas do Cerrado têm só um terço de sua estrutura acima da superfície e, para sobreviver num ambiente com solo oligotrófico (pobre em nutrientes), desenvolveram raízes profundas e bastante ramificadas.
"Se você arrancar uma dessas plantas, vai contar milhares ou até milhões de raízes, e quando cortar uma raiz e levá-la ao microscópio, verá inúmeras outras minirraízes que se entrelaçam com as de outras plantas, formando uma espécie de esponja."
Esse complexo sistema radicular retém água e alimenta as plantas na estação seca. Graças a ele, as árvores do Cerrado não perdem as folhas mesmo nem mesmo no auge da estiagem - diferentemente do que ocorre entre as espécies do Semiárido, por exemplo.
Barbosa conta que, quando há excesso de água, as raízes agem como esponjas encharcadas, vertendo o líquido não absorvido para lençóis freáticos no fundo. Dos lençóis freáticos a água passa para os aquíferos.
O professor diz que essa dinâmica começou a ser afetada radicalmente nos anos 1970, com a expansão da pecuária e de grandes plantações de grãos e algodão pelo Cerrado.
A nova vegetação tem raízes curtas e não consegue transportar a água para o fundo.
Pior: entre a colheita e o replantio, as terras ficam nuas, fazendo com que a água da chuva evapore antes de penetrar o solo. Em alguns pontos do Cerrado, como no entorno de Brasília, o uso de água subterrânea para a irrigação prejudica ainda mais a recarga dos aquíferos.
Em fevereiro, Brasília começou a racionar água pela primeira vez na história - e meses antes do início da temporada seca.

Migração de nascentes

Conforme os aquíferos deixaram de ser plenamente recarregados, Barbosa diz que se acelerou na região um fenômeno conhecido como migração de nascentes.
Para explicar o processo, ele recorre à imagem de uma caixa d'água com vários furos. Quando diminui o nível da caixa d'água, o líquido deixa de jorrar dos furos superiores.
Com os aquíferos ocorre o mesmo: se o nível de água cai, nascentes em áreas mais elevadas secam.

Reserva Extrativista de Recanto das Araras de Terra Ronca

Ele diz ter presenciado o fenômeno num dos principais afluentes do São Francisco, o rio Grande, cuja nascente teria migrado quase 100 quilômetros a jusante desde 1970.
O mesmo se deu, segundo Barbosa, nos chapadões no oeste da Bahia e de Minas Gerais: com a retirada da cobertura vegetal, vários rios que vertiam água para o São Francisco e o Tocantins sumiram.
O professor diz que a perda de afluentes reduziu o fluxo dos rios e baixou o nível de reservatórios que abastecem cidades do Nordeste, Centro-Oeste e Norte.
Em 2017, segundo a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sedec), o número de municípios brasileiros em situação de emergência causada por longa estiagem chegou a 872, a maioria no Nordeste.
Já em São Paulo as chuvas de verão aumentaram os níveis das represas e afastaram no curto prazo o risco de racionamento. Mas Barbosa afirma que a maioria dos rios que cruza o Estado é alimentada pelo aquífero Guarani, cujo nível também vem baixando.
O aquífero abastece toda a Bacia do Paraná, que se estende do Mato Grosso ao Rio Grande do Sul, englobando ainda partes da Argentina, Paraguai e Uruguai.

Fotografia do passado

Bastaria então replantar o Cerrado para garantir a recarga dos aquíferos?
A solução não é tão simples, diz o professor. Ele conta que o Cerrado é o mais antigo dos biomas atuais do planeta, tendo se originado há pelo menos 40 milhões de anos.
Segundo ele, olhar para o Cerrado é como olhar para uma fotografia do passado.

Parque das Emas

"O Cerrado já atingiu seu clímax evolutivo e precisa, para o seu desenvolvimento, de uma série de fatores que já não existem mais."
Ele exemplifica: há plantas do Cerrado que só são polinizadas por um ou outro tipo de abelhas ou vespas nativas, várias das quais foram extintas pelo uso de agrotóxicos nas lavouras. Essas plantas poderão sobreviver, mas não serão mais capazes de se reproduzir.
O Cerrado também é uma espécie de museu porque muitas de suas plantas levam séculos para se desenvolver e desempenhar plenamente suas funções ecológicas. É o caso dos buritis, uma das árvores mais famosas do bioma, que costuma brotar em brejos e cursos d'água.
Barbosa costuma dizer que, quando Cabral chegou ao Brasil, os buritis que vemos hoje estavam nascendo.
Mesmo plantas de pequeno porte costumam crescer bem lentamente. O capim barba-de-bode, por exemplo, leva mais de mil anos para atingir sua maturidade. Barbosa diz ter medido as idades das espécies com processos de datação em laboratório.

Parceria com animais

Sabe-se hoje da existência de cerca de 13 mil tipos de plantas no Cerrado, número que o torna um dos biomas mais ricos do mundo. Dessas espécies, segundo o professor, não mais que 200 podem ser produzidas em viveiros.
Ele conta que a ciência ainda não consegue reproduzir em laboratório as complexas interações entre os elementos do bioma, moldadas desde a era Cenozoica.
Barbosa diz, por exemplo, que muitas plantas do Cerrado têm sementes que são ativadas apenas em situações bem específicas. Algumas delas só têm a dormência quebrada quando engolidas por certos mamíferos e expostas a substâncias presentes em seus intestinos.
Há ainda sementes que precisam do fogo para germinar. Contrariando o senso comum, Barbosa diz que incêndios naturais são essenciais para a sobrevivência do Cerrado e podem ocorrer de duas formas.

Chapada dos Veadeiros

Uma delas se dá quando blocos de quartzo hialino, um tipo de cristal, agem como lentes que concentram a luz do sol, superaquecendo a vegetação.
A outra ocorre pela interação entre algumas plantas e animais do Cerrado, entre os quais a raposa, o lobo-guará, o tamanduá-bandeira e o cachorro-do-mato-vinagre.
Segundo Barbosa, esses mamíferos carregam no pelo uma carga eletromagnética que, em contato com gramíneas secas, provoca faíscas.
O professor diz que o fogo é necessário não só para ativar sementes, mas para permitir que gramíneas secas, que não têm qualquer função ecológica, sejam substituídas por plantas novas.
"Se a gramínea seca fica ali, não tem como rebrotar, então é preciso dessa lambida de fogo natural pra limpar aquele tufo."
Os incêndios também são importantes, segundo ele, para que o solo do Cerrado continue pobre - afinal, foi nesse solo que o bioma se desenvolveu.
"O fogo é paradigma para quem pensa na preservação. Se você pensa como agrônomo, o fogo é nocivo, porque acentua o oligotrofismo do solo."

Estancar os danos

Quando deixa de haver incêndios naturais, os animais e insetos nativos desaparecem e as plantas do Cerrado são derrubadas, é quase impossível reverter o estrago, diz Barbosa.
Mesmo assim, ele defende preservar toda a vegetação remanescente para estancar os danos.
Barbosa diz torcer para que, um dia, a ciência encontre formas de recuperar o bioma.
"Claro que você não vai reocupar toda a área que está produzindo [alimentos], mas você pode pelo menos tentar amenizar a situação nas áreas de recarga de aquíferos."
Sua preocupação maior é com a fronteira agrícola conhecida como Matopiba, que engloba os últimos trechos de Cerrado no Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Nos últimos anos, a região tem experimentado uma forte expansão na produção de grãos e fibras.
"Se esse projeto continuar avançando, será o fim: aí podemos desacreditar qualquer possibilidade, porque não teremos nem matriz para experiências em laboratório."
Nesse cenário, diz Barbosa, os aquíferos do Cerrado rapidamente se esgotarão.
"Os rios vão desaparecer e, consequentemente, vai desaparecer toda a atividade humana da região, a começar das atividades agropastoris."
"Teremos uma convulsão social", ele prevê.
BBC Brasil

quinta-feira, 30 de março de 2017

Twitter deixa de contar as menções nos 140 caracteres



O Twitter confirmou nesta quinta-feira que está deixando de contar as menções de usuários dentro dos 140 caracteres. O anúncio ocorre depois que a empresa afirmou, há quase um ano, que faria mudanças para que os usuários pudessem aproveitar plenamente o espaço de cada publicação –qualquer elemento complementar ao texto, como fotos, vídeos, pesquisas ou gifs deixaria de ocupar espaço no tuíte. Todos os usuários, por meio da página web da rede social e dos apps para Apple e Android, já podem desfrutar do primeiro passo dessas mudanças.
 
A nova interface de 'respostas' de Twitter.
 
A partir de agora, a interface do Twitter mostrará acima do texto os nomes de todos os que participam de uma conversa, como se fosse o destinatário de uma mensagem direta, em lugar de dentro do tuíte. O usuário pode clicar em Tuíte sua resposta para ver quem está na conversa e fazer mudanças na lista de respostas, se assim desejar. Isso é feito desmarcando as caixas de seleção no pequeno pop-up que aparece na tela depois de clicar nesse campo. Desse modo, o tuiteiro pode concentrar-se na leitura das mensagens reais, sem ter que anotar primeiro os nomes de usuário.
A nova interface se aproxima do design original da plataforma, pensada inicialmente como um serviço de mensageria pública, uma versão digital dos SMS, que estão limitados a 160 caracteres. A mudança no uso das menções representa o fim de um marco para a rede social que popularizou o símbolo @, que passou a ser utilizado em outras redes, como Facebook, Instagram, Tumblr, Linkedin, Slack e até mesmo o Outlook. Uma questão pendente no Twitter é eliminar a fórmula ".@" para que a menção chegue a todos os seguidores, mas os programadores da rede social afirmam que estão “trabalhando nisso”.
Os dirigentes da empresa dizem que esta atualização “se baseia na retroalimentação dos usuários, na pesquisa e nos testes que foram realizados” e observam que continuarão monitorando o uso e fazendo novas mudanças para melhorar a “experiência geral”.
El País.com

Os robôs chineses que podem limpar suas janelas

 
Zhang e Chen são um jovem casal de Xangai que alguns meses atrás alcançou o ansiado objetivo de adquirir um apartamento. É a 40 minutos de metrô do centro, mas eles terão de esperar 15 anos para quitar o financiamento, apesar de terem pagado 40% de entrada. Os dois trabalham, então desde o começo decidiram contratar uma faxineira para limpar a casa duas vezes por semana. “Até percebermos que máquinas poderiam fazer o trabalho dela de forma mais econômica”, conta ele.
 
Decidimos testar esse tal robô limpador de janelas, o Cop Rose. Há muitos outros parecidos, incluindo o precursor Windorobot. O Cop Rose, porém, não necessita de duas unidades unidas por um ímã, pois se trata de um aparelho com uma só peça, que faz a sucção com dois potentes ventiladores para aderir às superfícies verticais que irá limpar. Isso tem duas vantagens: ele consegue percorrer superfícies que um ímã seria incapaz de abranger por sua espessura, como a parede da cozinha, e pode operar também na horizontal, sobre o chão ou sobre mesas, e seu funcionamento é mais simples.
Sem dúvida, o aparelho faz seu trabalho. Basta acendê-lo, colocá-lo no vidro, esperar a que a sucção o segure com firmeza e apertar o botão de iniciar. Os dois esfregões circulares que cobrem os ventiladores começam a funcionar e alcançam até 99% da superfície da janela. Automaticamente, o eletrodoméstico procura o limite superior direito – de forma que chega inclusive aonde não chegaríamos –, e então tem início uma divertida coreografia descendente. O tecido apanha a sujeira, enquanto o resto das partículas de poeira é absorvido pelos ventiladores.
Porém, o Cop Rose, assim como outros modelos vendidos na Amazon a preços similares, como o Winbot W730, tem suas limitações. Em primeiro lugar, precisa estar sempre ligado à energia elétrica. Embora inclua um generoso cabo de quatro metros, é possível que haja lugares que não possa acessar, como uma janela enorme ou um local sem tomada por perto. Ele inclui, isso sim, uma bateria que permite manter a sucção durante 20 minutos em caso de interrupção da energia. Nessa situação, ele para, acende a luz vermelha de forma intermitente e emite um assobio agudo para alertar o usuário.
Por outro lado, o Cop Rose deve ser utilizado em superfícies secas. Ou seja, nada de usá-lo em plena chuva. É um fato que também limita de certa forma a capacidade limpadora do aparelho, já que se pode unicamente aspergir levemente um líquido limpa-vidros num dos dois círculos limpadores. A razão é simples: a umidade reduz a capacidade de grudar na superfície e faz com que o aparelho escorregue. No teste que realizamos com excesso de líquido, o robô não caiu, mas deixou zonas sem limpar nas quinas devido a um lento, mas inexorável, deslocamento para baixo, quando se supunha que deveria se deslocar na horizontal. Uma vez mais, o mesmo acontece com outros modelos similares.

O robô Cop Rose.

Finalmente, nas operações por fora da fachada se recomenda enfaticamente usar o sistema de segurança incorporado, que transforma o Cop Rose numa espécie de alpinista. O aparelho inclui uma corda e um mosquetão que precisa ser ancorar num lugar firme, para evitar que ele caia na rua em caso de perda da sucção. Obviamente, trata-se de um problema que acontece em raríssimas ocasiões, geralmente por alguma imprudência do usuário. No nosso caso, não ocorreu nem sequer quando o utilizamos nos azulejos da cozinha, que não são território idôneo, por causa do acúmulo de gordura e das fendas entre cada azulejo. Nessas condições, porém, o robô deixa grande parte da superfície sem limpar.
Como acontece com os robôs aspiradores de marcas como iLife, o robô limpadores de janelas podem ser controlados à distancia, com um controle muito simples: conta com um botão de liga-desliga, flechas para movê-lo de um lado para outro e três modos de operação, que só se diferenciam pela ordem em que o aparelho se move. Em resumo, não há qualquer dificuldade em operá-lo. “É um aparelho que, numa cidade tão poluída como Xangai, acaba sendo prático, porque antes tínhamos as janelas quase opacas, e limpá-las por fora era complicado e perigoso”, observa Zhang.
Mas a proliferação desses robôs, que também começam a ser usados nas suas versões industriais para limpar os arranha-céus das cidades chinesas, fazem temer por um bom número de postos de trabalho. Chen, que é engenheiro, atesta que a tendência também se dá em grandes fábricas que apostam na automatização como vacina contra os contínuos aumentos salariais na China. “Haverá quem diga que o mesmo já aconteceu com as máquinas de lavar roupa, mas a escala e o leque de trabalhos que os robôs podem realizar agora são incomparáveis. Sua proliferação representa um desafio para a geração de emprego pouco qualificado, que na China ainda é muito necessário.
El País.com

O que são os ácidos ascórbico e sórbico

A Operação Carne Fraca da Polícia Federal, deflagrada na última sexta-feira (17), divulgou que frigoríficos brasileiros "maquiavam" carnes vencidas com ácido ascórbico e ácido sórbico para que os alimentos parecessem saudáveis. A Polícia disse que esses químicos são cancerígenos e poderiam prejudicar a saúde da população. Mas o que diabo esses ácidos realmente fazem?
Embora os químicos fossem utilizados de maneira irregular para modificar a aparência dos produtos, eles não são tão perigosos como alarmou a PF. De acordo com a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), as substâncias não são cancerígenas e constam na lista de aditivos alimentares aprovados.

Além disso, o material colhido pelas autoridades não é tão conclusivo quanto se propagou nos últimos dias. Essas substâncias foram citadas por funcionários dos frigoríficos em escutas gravadas. Nos documentos já publicados pela polícia, a operação realizou dois testes laboratoriais nas empresas investigadas, portanto, detalhes como a concentração exata das substâncias não foram obtidos cientificamente. Há, no entanto, boa parte da operação ainda em sigilo.
Ácido ascórbico
O ácido ascórbico é mais conhecido como vitamina C e, pelas regras da Anvisa, pode ser usado em "quantidade suficiente para obter o efeito". O efeito é conservar a carne, porém pode ser usado para deixar a carne com a cor vermelha por mais tempo, sempre nos processados. Consultado pelo UOL, o professor de microbiologia de alimentos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul disse que "o ácido ascórbico pode devolver a cor vermelha da carne. Ela volta a parecer saudável para o consumo e engana quem for comer". O professor diz ainda que a carne in natura não pode ter nenhum aditivo.
A vitamina não oferece risco com a ingestão diária recomendada de 40 mg. Acima dessa quantidade, é possível que homens desenvolvam cálculos renais, conforme mostrou uma pesquisa publicada no periódico JAMA Internal Medicine. A substância não está relacionada de nenhuma maneira com o surgimento de câncer.
Ácido sórbico
O ácido sórbico é um composto orgânico que, na lista da Anvisa, aparece na categoria de conservante, podendo ser usado na dosagem de 0,02 g por 100 g de carne. O que lhe confere o atributo de conservante é sua propriedade antimicrobiana, útil em alimentos como margarinas, cremes, sucos de frutas, doces, enlatados em geral, pães, embutidos e carnes, preservando, neste último, a cor vermelha. O ácido sórbico é também utilizado nas indústrias farmacêutica (medicamentos, especialmente antifúngicos, cosméticos e cremes dentais) e química (na produção de látex, tabaco, papel, rações animais e fungicidas agrícolas).

O ácido sórbico é um forte inibidor de mofo, leveduras e bolor, mas não tão eficaz em inibir bactérias. Segundo o UOL, pode causar alergia, mas as chances são baixas. Em depoimento ao portal, o nefrologista Istênio José Pascoal negou relação entre a substância e problemas renais: “Não conheço, nem encontrei, qualquer evidência de efeitos adversos renais da ingestão de ácido sórbico". Também não existem pesquisas que sustentem a relação entre o ácido e pedras nos rins.
Na única escuta divulgada pela PF, o ácido sórbico é citado em uma conversa entre sócios do frigorífico Peccin, em que um deles pergunta se poderia usá-lo na produção de linguiça de frango. Consultado pelo Nexo, o professor Sérgio Bertelli Pflanzer Júnior, da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp, afirma que a substância “evita o crescimento de bactérias em produtos como o salame”, mas que “não faz muito sentido usá-lo em uma linguiça de frango”.

Nos Estados Unidos, para aplicações alimentícias, o ácido sórbico tem a designação de “reconhecido geralmente como seguro”, do FDA, órgão responsável pelo controle dos alimentos no país. “Não há evidência nas informações disponíveis sobre o ácido sórbico (...) que demonstre ou sugira base razoável para suspeitas ou perigo ao público quando usado nos níveis atuais”, conclui o relatório do FDA.
Apesar da gravidade das denúncia da Polícia Federal, os termos utilizados para tratar sobre os ácidos aparentemente tomaram proporções maiores do que de fato têm. À BBC Brasil, a engenheira de alimentos Carmen Castillo alertou para o perigo de se demonizar substâncias necessárias para o processamento dos alimentos, enquanto Pedro Eduardo de Felício, da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp, criticou o tratamento da PF na divulgação das informações: "A polícia agiu mal com a maneira como divulgaram tudo. Acho que houve um certo exagero, para precipitar a loucura que foi na imprensa".

quarta-feira, 29 de março de 2017

Como a destruição do cerrado pode fazer faltar água no Brasil inteiro

Medidor na Barragem do Descoberto.O reservatório atingiu o nível mais baixo da história (Foto: GABRIEL JABUR)

Rio Descoberto, que marca a divisa do estado de Goiás com o Distrito Federal, segue em desabalada corrida até encontrar uma parede. Uma barreira, a cerca de 50 quilômetros a oeste de Brasília, que faz o rio virar um lago, destinado a abastecer com água por volta de 1,8 milhão de pessoas que vivem na região. Quase todos os anos, o Descoberto segue um itinerário previsível: enche na estação chuvosa, entre outubro e abril. Perde volume em meses de seca. Em 2017, não foi assim. Os meses de chuva chegaram, a água não veio. O Descoberto virou um filete desaguando em uma represa quase vazia. E a capital do país passou a Semana da Água com o tom da escassez.
Desde o ano passado, o Distrito Federal enfrenta uma severa crise hídrica. As duas barragens que abastecem a região, Santa Maria e Descoberto, mantêm níveis muito abaixo do esperado para a época: Santa Maria acumula 48% da água que poderia represar. Descoberto, 44%. Já foi pior – ficou abaixo dos 20% em janeiro. A crise hídrica fez o governo decretar racionamento sem data para acabar. Ela não foi uma surpresa: desde 2016, a Agência Nacional de Águas (Ana) incluia região em sua lista de áreas vulneráveis em relação ao abastecimento de água. Para evitá-la, faltou planejamento público – o governo poderia ter criado formas de captar água em outras fontes, em lugar de depender, majoritariamente, de duas barragens. Faltaram chuvas e faltou proteger a vegetação da região.
O Cerrado, por onde corre o Rio Descoberto, é o segundo maior bioma do Brasil: são mais de 2 milhões de quilômetros quadrados espraiados por 12 estados. É também lar de uma imensa diversidade de vida: mais de 13 mil espécies de plantas, 850 de aves e 250 de mamíferos. Está encarapitado sobre três dos principais aquíferos da América do Sul: o Guarani, o Bambuí e o Urucuia. A água que chove no Cerrado penetra o solo e fica armazenada na rocha porosa. É distribuída para o Brasil inteiro: estima-se que,  em diferentes proporções, o Cerrado abasteça oito das 12 regiões hidrográficas do país. A água do subsolo ainda responde por cerca de 90% da vazão dos rios do bioma. “Só que os níveis da água subterrânea estão diminuindo com o tempo”, diz José Eloi, especialista em hidrogeologia e professor da Universidade de Brasília (UnB). “Córregos que costumavam ser perenes, agora desaparecem em períodos de seca.” Com frequência cada vez maior, a água que deveria penetrar o solo, para alimentar aquíferos e lençóis freáticos, escorre pela superfície e se evapora. Quando a chuva vai embora, diminui a vazão dos rios que alimentam as barragens que abastecem as casas. O fenômeno é consequência de um acelerado processo de desmatamento.
Não é um problema só do Distrito Federal. O Cerrado é a grande vítima invisível do desmatamento no Brasil. Enquanto os olhos nacionais e internacionais estão voltados para a Floresta Amazônica, a diversificada vegetação do Cerrado (que vai de campos naturais até – acredite – formações florestais) vem sendo varrida do mapa. O desmatamento no Cerrado ganhou fôlego na década de 1970, estimulado por projetos do governo que favoreciam a ocupação da região.  Plana e fácil de irrigar, a área era ideal para a expansão da agropecuária. Hoje, o Cerrado é o bioma brasileiro que concentra o maior rebanho bovino (cerca de 36% de todo o gado) e onde mais se produz soja (mais de 63% de todo o grão brasileiro). Em menos de 50 anos, quase 50% da vegetação original desapareceu. E 30% da área virou pasto: “Foi um processo de desmatamento muito rápido, sem precedentes”, diz Laerte Ferreira, da Universidade Federal de Goiás (UFG). E o desmatamento continua até hoje. Enquanto o ritmo do desmatamento na Floresta Amazônica caiu nos últimos dez anos – conquista comemorada internacionalmente pelo país –, a devastação do Cerrado se manteve no mesmo ritmo. Nos últimos dez anos, o Cerrado perdeu 50.000 quilômetros quadrados, mais que o estado do Rio de Janeiro. A maior fronteira de desmatamento do Brasil hoje é a expansão da soja na região do Cerrado chamada Matopiba (áreas dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e da Bahia). Entre 2015 e 2016, o desmatamento lá foi de 2.000 quilômetros quadrados, quatro vezes mais que no Arco do Desmatamento, área mais vulnerável da Amazônia Legal.

A DESTRUIÇÃO DAS NASCENTES O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro – e abastece, com água, o país todo. Essa capacidade está ameaçada pelo desmatamento acelerado (Foto: Fonte: Laerte Ferreira/Lapig UFG)
Embora não tenha sempre uma formação exuberante de floresta (às vezes tem), o Cerrado possui um papel importante para matar a sede do país. A vegetação original do Cerrado tem raízes longas, que entram profundamente no solo e criam caminhos por onde a água pode passar: “Quando as árvores morrem, essas raízes formam um caminho preferencial para a infiltração”, diz Eloi, da UnB. Substituí-la dificulta a recarga do aquífero. A vegetação exótica tem raí­zes curtas, que não se prestam a esse serviço. Nas áreas de pastagem mal manejadas, o pisoteio do gado ainda compacta o solo. A água não penetra nas pastagens degradadas. Estima-se que 70% delas apresentem algum grau de degradação. O desmatamento do Cerrado demorou a ser visto como um problema. A vegetação do bioma é variada, com regiões de mata fechada. Mas é marcada pelos campos abertos e pelas formações arbustivas. “Por muito tempo, o Cerrado não foi considerado floresta – e a legislação brasileira protegia somente florestas”, diz Gabriela Savian, especialista em egislação ambiental que trabalhou em ONGs como a Conservação Internacional. “Foi a partir do Código Florestal de 1965 que passamos a proteger a ‘vegetação natural’.” O Cerrado só apareceu explicitamente nesse texto em 1989, quando foi aprovada uma lei que modificava o código para incluir o bioma.
Código Florestal protege menos o Cerrado que outros biomas. A lei cobra das propriedades rurais que mantenham 35% do Cerrado nativo (em áreas de floresta, a cobrança é de 80%). O Cerrado ainda é mais vulnerável porque parcela menor dele é coberta por reservas e unidades de conservação – 11%, em comparação com 50% na Amazônia. Ativistas defendem que essa proporção aumente: “Somente a lei não foi suficiente para evitar o desmatamento”, diz Gabriela. Mesmo assim, calcula-se que, se a lei tivesse sido respeitada, os danos observados hoje seriam sensivelmente menores: “Em um cálculo grosseiro, 30% do Cerrado teria sido desmatado”, diz Laerte, da UFG. E não os quase 50% que foram perdidos.
Há sinais animadores de mudança. A capa de invisibilidade pode estar se desvanecendo. No começo de março, a ONG americana Mighty Earth divulgou um estudo que demonstra que grandes empresas haviam desmatado áreas do Cerrado para plantar soja – usada para alimentar rebanhos de uma rede global de fast-food. O levantamento repercutiu na imprensa internacional. “A resposta a nosso relatório foi surpreendente. Há grandes e pequenas empresas e pessoas comuns, hoje, interessadas em saber o que é possível fazer para deter a destruição desse bioma”, diz Anahita Yousefi, diretora de Campanhas da Mighty Earth e uma das autoras do estudo. “Algumas das maiores empresas de bens de consumo do mundo, como o Walmart, o Carrefour e o McDonald’s (que não foi alvo do estudo), hoje oferecem apoio a uma moratória da soja também para o Cerrado. Empresas como Wilmar e Louis Dreyfus, que competem com as produtoras de soja denunciadas pela ONG, também apoiam a ideia. Graças à pressão do público, agora essas grandes empresas reconhecem que compartilham a responsabilidade de evitar a destruição desnecessária do Cerrado.”
A pressão pela conservação poderá contar com mais informações também. Parte do sucesso brasileiro em proteger a Amazônia aconteceu graças a um eficiente sistema de monitoramento do desmatamento por satélite. Em 2015, o Ministério da Ciência conseguiu financiamento internacional para desenvolver, para o Cerrado, algo semelhante. Além disso, cresce a consciência de que é possível cultivar alimentos e preservar a vegetação nativa. Sobretudo em uma região como o Cerrado, dominada por pastagens improdutivas. “É possível ampliar a área de cultivo no Cerrado sem derrubar uma só árvore”, diz Bernardo Strassburg, professor da PUC-Rio. As pastagens na região abrigam um boi por hectare. Estudos feitos por Strassburg mostraram ser possível aumentar esse número para três, sem degradar o terreno. A área liberada seria superior à expansão projetada dos cultivos de soja e cana até 2040 em todo o país.
Proteger o que resta do Cerrado é urgente porque as áreas degradadas no bioma são de difícil recuperação. A reconstituição é feita com plantas nativas intercaladas à vegetação exótica: “Mas é um processo complicado, que ainda não dominamos”, diz Rafael Loyola, professor da Universidade Federal de Goiás. Por vezes, a vegetação nativa replantada não vinga. As peculiaridades de formação do bioma dificultam. Ele surgiu há 65 milhões de anos: “O Cerrado está entre os ambientes mais antigos da Terra”, diz Altair Barbosa, professor aposentado da PUC-Goiás e especialista em Cerrado. “Já chegou a seu apogeu evolutivo.” Isso significa que qualquer perturbação no equilíbrio fino entre suas espécies pode causar danos irreparáveis. E custar recursos hídricos importantes para o país todo.
BERÇO DAS ÁGUAS O Cerrado alimenta oito das 12 regiões hidrográficas brasileiras. Alguns dos principais rios do país dependem das nascentes do Cerrado (Foto: Fonte:  Jorge Furquim/Embrapa Cerrados)