A edição de setembro da revista Scientific American Brasil, traz como artigo de capa um tema que até recentemente esteve confinado à ficção científica e por isso mesmo é algo perturbador: "os multiversos".
A primeira versão dessa ideia, conhecida como universos paralelos, levava em conta o que ficou conhecido como "buracos de minhoca" ou Ponte de Einstein-Rosen, conexões no espaço-tempo entre dois pontos de um único ou dois universos.
Na década passada, no entanto, uma variação dessa concepção expandiu entre a comunidade cosmológica internacional, com defensores e críticos postados em cada uma das extremidades dos debates.
Aqui o conceito básico é que o Universo, em ves de único, pode ser apenas mais um, algo que, em certos casos, pode ser comparado a um aglomerado de bolhas de sabão acumulado nas bordas de uma banheira.
Em artigos que a revista já publicou, caso de "A Procura por Vida no Multiverso", em fevereiro de 2010, do físico americano Brian Greene, um dos reconhecidos especialistas na Teoria de Cordas, fala-se, em relação a multiversos, de uma "revolução supercopernica".
A diferença é que desta vez, não apenas estaríamos deixando o centro do Universo, como propôs o sábio polonês em 1543, mas de uma situação em que fica completamente inconsistente o sentido etmológico de Universo.
"O multiverso realmente existe"? foi escrito pelo físico e cosmólogo George F.R.Ellis, da Cape Town University, na África do Sul.
Além do chamado universo observável - algo parecido à situação de um observador postado, por exemplo, no topo de um farol no centro de uma pequena ilha, que é incapaz de enxergar um navio abaixo da linha do horizonte - pode haver ínúmeros outros universos fora de nossa observação direta.
Ainda com base no exemplo anterior, embora um observador postado no topo do farol, no centro da pequena ilha não possa observar, além da linha do horizonte existem tantas outras ilhas como continentes inteiros fora de sua visão direta.
Para a parcela dos cosmólogos afeitos à teoria do multiverso, haveria basicamente dois níveis de universos.
O primeiro grupo, em que Ellis se inclui, de nível 1 - segundo uma classificação feita pelo cosmólogo sueco-americano Max Tegmark, do Massachusetts Institute of Technology (MIT) da Califórnia - teriam as mesmas leis físicas em comum.
Mas outros, vão bem mais longe. Para Aleksander Vilenkim, diretor do Instituto de Cosmologia da Tufts University, em Massachusetts, vão bem mais longe.
Para ele multiversos de nível 2 teriam infinito universos, com infinitas galáxias, infinitos planetas e um infinito número de pessoas com o mesmo nome do leitor, lendo exatamente este artigo.
Neste segundo caso, as leis da física seriam diferentes, de bolha para bolha.
Ou seja, na concepção de Valenkim, cuja universidade é pioneira em formar novos líderes para um mundo em mudança, teríamos na essência um jogo de espelhos com universos infinitos em vez de um único como pensamos recentemente.
Como se vê, é o caso, ao menos aparente, do que sempre julgamos pura ficção, substituindo a realidade.
Na verdade, no entanto, como demonstrou Nicolau Copérnico em meados do século 16, é que a mudança paradigmática de um conceito cosmológico tende a produzir, ao longo do tempo, transformações profundas e irreversíveis na cultura.
Tudo se passa como um sismo poderoso, onde se distingue claramente as realidades de um antes e um depois.
A concepção do que agora chamamos de multiverso, diz Ellis em seu artigo, remonta à Antiguidade e inclui mais de uma cultura humana. O que é novo, aponta, "é a asserção de que o multiverso é uma teoria científica, com tudo o que implica ser uma teoria matematicamente rigorosa e testável".
Ele se confessa "um cético" quanto à ideia de multiverso ter sido demonstrada suficientemente ou mesmo que isso venha a ocorrer.
Mas reconhece que os proponentes do multiverso, "ao mesmo tempo em que engrandecem nossa concepção de realidade física, estão redefinindo o que se entende por ciência".
Aqui é inevitável retomar um acontecimento que alterou radicalmente a visão do céu. Em uma de suas obras o filósofo francês Auguste Comte (1798-1857) disse que as estrelas permaneceriam para sempre desconhecidas dos humanos por estarem a enormes distâncias e serem muito quentes.
Mas em 1925, a astrônoma americana Cecília Payne Gaposchkin (1900-1979) defendeu sua tese de doutorado e enterrou literalmente a previsão sensata do pai da sociologia.
No trabalho que ficou conhecido como "a tese mais brilhante já escrita em astronomia", ela predisse a composição estelar antecipando que essas fogueiras cósmicas distantes são formadas majoritariamente por hidrogênio.
Fonte: Scientific American.com