quinta-feira, 7 de abril de 2016

Aquecimento facilita difusão de doenças

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A emergência global de saúde pública envolvendo bebês com microcefalia surgiu em 2015, o ano mais quente registrado na história, com um surto no Brasil de uma doença transmitida por mosquitos. Seria coincidência?
Cientistas dizem que levarão anos para responder a essa questão e indicam outros fatores que podem ter desencadeado a crise. No entanto, eles afirmam que a epidemia de zika, assim como a disseminação da dengue (que infecta até 100 milhões de pessoas por ano e mata milhares), devem ser interpretadas como advertências.
Nas próximas décadas, é provável que o aquecimento global aumente o âmbito e a velocidade do ciclo de vida dos mosquitos que transmitem esses vírus.
Uma pesquisa sugere que, no pior cenário, se as emissões globais continuarem altas e o crescimento populacional se mantiver acelerado, o número de pessoas expostas ao mosquito poderá mais que duplicar, chegando a 8 ou 9 bilhões até o final do século.
“Será mais difícil controlar os mosquitos”, disse Andrew Monaghan, que estuda a interação do clima com a saúde no Centro Nacional de Pesquisas Atmosféricas, em Boulder, Colorado. “Quanto maior o calor, mais depressa eles podem se desenvolver do ovo ao inseto adulto e mais depressa conseguem incubar os vírus.”
Suspeita-se que a mudança climática já tenha influído na disseminação de uma série de doenças que afetam pessoas e animais. Entre elas, a malária nos planaltos da África oriental, a doença de Lyme na América do Norte e uma afecção no gado chamada língua azul em partes da Europa.
Especialistas salientam que uma epidemia nunca é resultado de uma única variável. As epidemias sempre envolvem interações entre genes, ecologia, clima e comportamento humano. A zika e a dengue são casos típicos. Os vírus estão sendo transmitidos principalmente pelo mosquito da febre amarela, o Aedes aegypti.
As cidades situadas nos trópicos, a zona climática mais favorável ao mosquito, apresentaram um crescimento explosivo. A humanidade ultrapassou um marco alguns anos atrás, quando mais da metade da população passou a habitar áreas urbanas. Mas os gastos em tratamentos e em infraestrutura básica de saúde não acompanharam esse ritmo. O controle de mosquitos também não foi eficaz. O mosquito deposita os ovos em recipientes com água e são comuns nas enormes favelas da América Latina. Com acesso inconfiável à água encanada, muitos moradores armazenam água em cisternas e depósitos.
Isso é comum em áreas onde a zika se espalhou rapidamente, como as cidades de Recife e Salvador, no nordeste do Brasil, e onde a dengue experimentou um surto em 2015, como São Paulo, o mais populoso Estado brasileiro.
Ainda que os especialistas não compreendam até que ponto o aumento da temperatura contribuiu para os surtos, eles entendem alguns dos potenciais mecanismos. Os mosquitos vivem principalmente de néctar, mas a fêmea precisa ingerir sangue humano para ter proteínas suficientes para pôr os ovos. Quando ela pica uma pessoa infectada com zika ou várias outras doenças, contrai o vírus.
O vírus tem de se reproduzir no mosquito durante um período antes que possa ser transmitido para outra pessoa em uma picada. Quanto maior a temperatura do ar, menor o período de incubação. Além disso, até certo ponto, a temperatura mais alta faz com que os mosquitos amadureçam mais depressa.
Com o aumento da temperatura, “acelera-se todo o ciclo reprodutivo do mosquito”, disse Charles B. Beard, chefe de uma unidade de estudo de doenças transmitidas por mosquitos nos CDC (sigla em inglês para Centros de Controle e Prevenção de Doenças), em Atlanta (EUA). “Temos populações maiores, com mais gerações de mosquitos, em um clima mais quente e úmido.”
O Aedes aegypti está presente em todo o sul dos EUA, mas não prospera em áreas com invernos frios. Pesquisas sugerem que o aquecimento climático poderá permitir que o mosquito se espalhe pela América do Norte nas próximas décadas.
Em princípio, o risco não se aplica apenas a países temperados, mas a cidades em grande altitude em países tropicais, como a Cidade do México, com 21 milhões de habitantes. Enquanto as planícies do país são empesteadas por mosquitos da febre amarela, a capital está em um planalto que tem sido frio demais para esses insetos.
Mas a temperatura está subindo, e recentemente foram detectados mosquitos, em pequeno número, na cidade. “O mosquito no sopé da montanha, literalmente”, disse Monaghan. “Há potencial para a transmissão do vírus se as condições climáticas mudarem.”

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