segunda-feira, 3 de junho de 2013

Como o aquecimento global pode mudar nossa economia

Principal vilão das emissões de gases efeito estufa do Brasil, o desmatamento na floresta amazônica atingiu uma área de 175 km² entre março e abril de 2013, uma queda de quase 50% em relação aos doze meses anteriores. Apesar dos avanços, ainda há muito a ser feito.
Cerca de 26% do desmatamento na Amazônia Legal (área que engloba nove estados brasileiros) é causado pela pecuária. Segundo estudos do Instituto Nacional de Pesquisadas Espaciais (Inpe), entre 1990 e 2006 o rebanho existente na região subiu de 26 milhões (18% do total nacional) para 73 milhões de cabeças, o que equivale a 36% do total nacional.
Quanto mais cabeça de gado, mais espaço para a criação do rebanho é necessário. Dessa forma, a emissão de gases de efeito estufa (GEEs) resultantes das queimadas para limpeza do solo e dos dejetos dos animais acaba contribuindo para o aquecimento global.
Mas a pecuária, que é responsável por 50% das emissões de gases de efeito estufa no país, não leva a culpa sozinha. A agricultura também está no rol de atividades econômicas que contribuem para as mudanças climáticas.
Segundo Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), membro do Experimento de Larga Escala da Biosfera e Atmosfera da Amazônia (LBA) e do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), o agronegócio é um dos principais drivers quando se fala de mudanças climáticas.
O uso de fertilizantes e agrotóxicos leva à contaminação do solo e dos lençóis freáticos, e gera emissões de dióxido de carbono (CO2), óxido nitroso (N2O) e metano (NH4) para a atmosfera, compostos que contribuem para o efeito estufa.
Efeito colateral
E se toda ação tem uma reação, o agronegócio pode – e deve – se preparar para as influências das mudanças climáticas no setor. O aumento da temperatura, e a alteração no padrão das chuvas e dos níveis de fertilidade do solo podem afetar a produção de alimentos, a criação de rebanho, e até alterar o mapa geográfico dessas atividades.
Para Artaxo, com o aumento da população mundial e, consequentemente, da demanda por alimentos, países como Brasil e Índia – que possuem os maiores rebanhos bovinos do mundo - enfrentarão um grande desafio: alimentar a população sem aumentar consideravelmente a emissão de GEEs.
José Gustavo Feres, economista do IPEA especializado em meio ambiente, afirma que a pecuária intensiva pode ser uma solução. “Uma pecuária mais intensiva, além de apresentar melhor produtividade, evitaria a necessidade de expansão para novas áreas e o decorrente impacto sobre o desmatamento”, afirma o especialista. Ele acredita que o mesmo aconteceria com a recuperação e reaproveitamento de pastos degradados.
Para a agricultura a alternativa pode ser o investimento em métodos de irrigação, que tornaria os agricultores menos vulneráveis a falta de chuvas. Além disso, a biotecnologia pode desenvolver plantas mais adaptadas a climas quentes e ambientes de estresse hídrico. “Mas medidas de adaptação tem seus limites. Há regiões no Nordeste, por exemplo, onde não há disponibilidade hídrica para se implementar sistemas de irrigação”, alerta Feres.
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) vem pesquisando novas técnicas agrícolas, como o plantio direto, que minimizam a emissão de gases de efeito estufa sem afetar a produtividade. Há também estudos para reduzir a quantidade de gás metano produzido pelo gado.
Energia em perigo
Mas se engana quem pensa que o agronegócio será o único setor econômico afetado. Segundo um relatório divulgado em 2012 pelo grupo independente Dara, e pelo Fórum de Vulnerabilidade Climática, as mudanças climáticas estão custando, por ano, uma redução de 1,6% do PIB global – o equivalente a US$ 1,2 trilhão –, e essa quantia deve dobrar a partir de 2030. ”Não haverá um único setor da economia que não seja afetado pelas mudanças climáticas”, afirma Artaxo.
O setor de geração de energia será um dos que terá que se readequar. Atualmente, os reservatórios das usinas hidrelétricas já começam a sofrer com a redução das chuvas e de vazão dos rios. Se as secas se intensificarem, o governo se verá obrigado a apostar em outras alternativas.
Na opinião de Artaxo, a região sul do Brasil está perto da saturação de seus recursos hidrelétricos, e conta apenas com poucas opções: energia nuclear, as termelétricas e o uso de combustíveis fósseis – que contribuem para a emissão de gases de efeito-estufa - ou a construção de hidrelétricas em regiões como a Amazônia. A segunda opção não seria tão eficiente, pois além das áreas inundadas, os custos para as obras de transmissão de energia seriam muito altos.
A solução também pode estar em novas tecnologias. “O COP está terminando um projeto de hidrelétricas de fluxo contínuo, onde você não precisa de reservatórios para produzir eletricidade”, conta Artaxo. O próprio fluxo do rio passando pelas turbinas pode gerar energia, sem a necessidade de inundar grandes áreas, e a um custo razoável.
Quem paga a conta?
Com o aumento da frequência de eventos extremos (chuvas, enchentes, tornados) causados pelas mudanças climáticas, o setor de Seguros também será afetado, sendo obrigado a desembolsar grandes quantias em indenizações a seus segurados.
Segundo Luiz Jurandir Simões, professor de Ciências Atuariais na USP, as empresas serão obrigadas a reprecificar os riscos. “Terá que cobrar mais. Se o aumento for exorbitante, o que pode acontecer é que alguns riscos deixarão de ter seguro”, afirma o especialista em modelagem de risco e precificação de ativos.
Dessa maneira, dificilmente a inflação não será atingida. A soja é uma das culturas mais vulneráveis às mudanças climáticas, e a queda na sua produtividade terá impacto direto nas exportações brasileiras, o que pode trazer problemas para a balança de pagamentos.
Com as dificuldades no setor agropecuário, a oferta de alimentos deve diminuir, o que pode encarecer também o preço da alimentação. Os preços de serviços como o de iluminação e saneamento serão alterados, assim como o dos combustíveis, já que a exploração de petróleo ficará comprometida.
O estudo “Economia da Mudança no Clima no Brasil”, desenvolvido por instituições públicas brasileiras como a Embrapa, a USP, e o Instituto de Pesquisas Amazônicas (Ipam) traz algumas possibilidades de adaptação e mitigação. O uso de energias renováveis e biocombustíveis são exemplos de alternativas viáveis que podem reduzir os danos.
Segundo Artaxo, o fato é que não existe atividade socioeconômica que não traga algum dano ambiental. “Tudo tem um preço, a questão é como você minimiza esse preço. E a decisão é da sociedade”, afirma o cientista.
Exame.com

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