A pouco mais de 5 quilômetros do Stade de France, local onde um homem-bomba matou uma pessoa nos atentados de 13 de novembro, Paris receberá nada menos que 138 chefes de Estado e governo. Líderes como o presidente americano, Barack Obama, e o presidente chinês, Xi Jinping, confirmaram presença, mesmo com a ameaça terrorista. A presidente Dilma Rousseff também. Eles se encontrarão para resolver um problema talvez tão complicado quanto o terrorismo: o combate ao aquecimento global. Paris sediará a 21ª Conferência da ONU sobre mudanças climáticas com a promessa de, em duas semanas, firmar um acordo capaz de reduzir a emissão de gases de efeito estufa e impedir um futuro catastrófico.
Após anos de negociações travadas, a pressão é grande para que um acordo seja assinado. O planeta já está 0,85 grau célsius mais quente que no século XX, e 2015 deverá bater os recordes de calor – isso para não falar no aumento do número de furacões, extinção de espécies, secas e outros desastres climáticos. Nesse cenário, assinar um acordo global é crucial. E, na opinião de quem participa do processo, há esperança. “Acho que um acordo será assinado sim em Paris”, diz o climatologista brasileiro Carlos Nobre, presidente da Capes – órgão do Ministério da Educação para pós-graduação – e um dos principais cientistas climáticos do Brasil. “Talvez não seja um texto totalmente abrangente, mas sinalizará uma direção positiva.”
O processo para assinar um acordo começou no Rio de Janeiro, em 1992. Passou pela assinatura do Protocolo de Kyoto, em 1997, que nunca foi efetivo porque foi rejeitado pelo Congresso americano. Em 2009, na Dinamarca, as negociações chegaram a seu ponto mais baixo. Parecia impossível convencer os países ricos a adotar as mesmas políticas para o futuro do clima. Os negociadores mudaram de estratégia. Em vez de tentar metas iguais para todos, inverteram o jogo. Cada país diz o que pretende fazer.
No jargão das negociações climáticas, o plano de cada país recebe o nome de INDC, sigla em inglês para Contribuições Pretendidas Determinadas Nacionalmente. A INDC do Brasil determina que vamos reduzir 37% de nossas emissões até 2025. Até o momento, 178 países apresentaram suas INDCs. O resultado é uma colcha de retalhos, com prazos e métricas convenientes a cada um. A Europa compara suas metas com as emissões de 1990, enquanto os Estados Unidos comparam com 2005. Alguns, como a China, nem sequer falam em redução de emissões. Em vez disso, os chineses prometem “chegar a um pico” de emissões em 2030, o que significa que continuarão poluindo muito pelos próximos 15 anos.
A própria ONU fez uma simulação com o resultado de todas as propostas. A análise mostra que as INDCs são melhores do que nada. Se nenhuma ação for tomada, o planeta caminhará para um aquecimento global de 4 a 6 graus célsius até 2030. Com as propostas, esse aumento da temperatura ficaria limitado a 2,7 graus célsius. A má notícia é que, segundo o consenso científico, 2 graus célsius é o limite para um aquecimento global tolerável. Passando desse limite, as previsões para aumento do nível do mar, redução de áreas agriculturáveis, maior frequência de furacões e tufões, chuvas e secas parecem roteiro de ficção científica. Eventos extremos como o temporal que matou 1.000 pessoas no Rio de Janeiro em 2011 seriam frequentes.
Para uma reunião que acontece em uma cidade sitiada pelo terrorismo e com perspectiva de fechar um acordo menos restritivo do que pede a ciência, a expectativa com a Conferência de Paris surpreende. Haverá um engajamento ímpar de governos estaduais, setor privado, líderes religiosos e até sindicatos. Uma das razões é a ideia de que um acordo, mesmo fraco, passará uma mensagem positiva, incentivando outros atores, como empresas, a também agir. Outra razão é mais pragmática. Há um mecanismo no texto para que as metas sejam revisadas a cada ciclo de cinco ou dez anos. Assim, os governos poderiam corrigir suas rotas para uma economia mais limpa já na próxima década. Quanto antes, melhor.