Em 2009, uma equipe multinacional formada por cientistas da Universidade de Amsterdã perfurou um poço com 4,5 mil metros de profundidade na foz do rio Amazonas. Eles não estavam a procura de petróleo, mas capitaneavam uma espécie de viagem no tempo. Sua busca era pelo mais primitivo leito do rio, enterrado por milhões de anos de deposição de sedimentos. Mais tarde, a equipe anunciou a descoberta em uma revista especializada: de acordo com as análises dos estratos, o rio mais caudaloso do planeta nasceu há 12 milhões de anos.
Foi esse o tempo necessário para que o Amazonas projetasse em suas margens uma gigantesca floresta tropical. Sua água segue até o Atlântico e, por evaporação, volta a despencar sob a forma de chuvas torrenciais na selva. Um ciclo generoso, expresso em proporções colossais: trajeto de 6.675 km a partir dos Andes e vazão média diária de mais de 17 trilhões de litros - 15% de toda a água enviada ao mar pelos rios do planeta. É uma espécie de encanamento invisível na atmosfera, que, de forma espantosa, é o mesmo desde os primórdios.
A generosa bacia Amazônica é o exemplo mais contundente de uma nação pródiga em rios, lagos e aquíferos que, juntos, concentram mais de 11% de toda a água doce disponível da Terra. Não há fartura semelhante em outros cantos do globo. Considerando toda essa abundância, cada brasileiro teria à sua disposição, na teoria, 34 milhões de litros por ano. É uma quantidade fabulosa, 17 vezes maior do que a ONU considera uma média confortável de consumo.
Nas próximas décadas, nas quais o recurso tende a tornar-se escasso em todo o mundo, o consumo consciente, todavia, está longe de ser uma realidade no Brasil. Por dia, o brasileiro utiliza 132 litros de água em banhos, bebidas, cozinha, lavagem de carros, calçadas e pisos, além da rega de jardins e plantações de tamanhos variados. Com isso, quase 30% da água tratada nas cidades escorre pelos vazamentos nas ruas e no subsolo.
O privilégio da abundância, todavia, não se aplica a todos no Brasil. A distribuição nacional do recurso, tal qual a renda, é perversa. Em torno de 80% da água concentra-se na Amazônia, onde vivem apenas 5% dos brasileiros, muitos dos quais diante de um terrível paradoxo: ainda que cercados de rios, os moradores da Região Norte reconhecem na água potável um artigo de luxo. Hoje, 19 milhões de pessoas, 10% da população não têm acesso à água tratada. É muita gente!!!
Em função disso e da pouca noção de cuidados básicos com higiene, o líquido que deveria matar a sede e garantir a saúde transmite doenças.
Já no semiárido nordestino, 18 milhões de pessoas sobrevivem em uma zona tomada por um dos maiores índices de evaporação do mundo. Ao longo do ano, ocorrem períodos de chuva, mas o solo e o clima árido não favorecem a formação de fontes ou rios volumosos. A pouca água acumulada nos poços rasos não recebe os cuidados básicos e acaba por se tornar, também, propagadora de enfermidades.
Os dados da Pesquisa Nacional de Amostras à Domicílio de 2009, e divulgada em 2010 pelo IBGE, servem como indicadores das dificuldades que estão por vir. Apesar dos progressos nos serviços de fornecimento de água potável por rede geral encanada (84% das residências do país), apenas 59% das pesquisadas possuem acesso a algum tipo de tratamento.
A ausência de um sistema abrangente de coleta e tratamento de esgoto resulta em corpos d´água poluídos em zonas urbanas. Vários dos aquíferos estão perto da exaustão e do colapso geológico.
Apesar da abundância dos recursos hídricos, o potencial do Brasil um dia chegará a seu limite: em 2030 estima-se que a população será de 238 milhões de pessoas (hoje somos 190,7 milhões). Como nunca, o Brasil terá de lidar de forma mais direta com o eterno conflito entre desenvolvimento e problemas ambientais.
Com a situação se agravando, a mudança nos hábitos de consumo d´água terá que ser mais consciente e mais radical!
Fonte: National Geographic
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